“Sisu — Uma História de Determinação” articula sua narrativa a partir de um período histórico marcado pelo desgaste absoluto: os meses finais da Segunda Guerra Mundial na Lapônia. Nesse cenário árido, devastado por retirada alemã e destruição sistemática, Aatami Korpi, interpretado por Jorma Tommila, é apresentado como um garimpeiro solitário que trabalha em silêncio, movido por um objetivo pragmático: extrair ouro suficiente para recomeçar a vida longe de qualquer resquício de conflito. A descoberta de uma quantidade significativa do metal altera o curso de sua jornada. A ambição não aparece nele, mas nos soldados nazistas que cruzam seu caminho, liderados pelo oficial Bruno, interpretado por Aksel Hennie. A partir desse encontro, a narrativa assume o ritmo de perseguição contínua, com cada decisão ancorada na lógica de sobrevivência e na preservação do que Aatami conquistou com esforço extremo.
A construção do protagonista como força imparável
A figura de Aatami é construída com mínima verbalização e máxima ação. Sua trajetória anterior como combatente de elite é insinuada de modo seco, sem sentimentalismo ou ornamentação, reforçando a percepção de que ele carrega um passado cuja brutalidade se refletiu na maneira meticulosa com que calcula cada movimento. Tommila interpreta o personagem como alguém moldado pela repetição de perdas, o que torna coerente sua reação imediata diante da ameaça. O filme utiliza esse ponto para organizar sequências que exploram tanto habilidade quanto resistência, mesmo quando os limites da verossimilhança são ultrapassados. Esse excesso não é colocado como falha estrutural, mas como decisão estética de Helander, que opta por elevar o protagonista a uma condição quase mítica sem desconectá-lo totalmente de sua origem humana. A violência, embora amplificada, conserva um sentido funcional: evidencia o contraste entre um indivíduo com objetivo definido e um grupo que opera exclusivamente pela lógica predatória da guerra.
A dinâmica entre força, território e desintegração
O percurso físico que Aatami realiza atravessando pântanos, ruínas e estradas destruídas funciona como demonstração do desgaste estrutural da região. Helander utiliza a travessia como metáfora de um país exaurido, e isso se torna claro quando as prisioneiras finlandesas, interpretadas por Mimosa Willamo e outras atrizes, surgem como contraponto à violência autoritária do pelotão nazista. A colaboração pontual delas com Aatami reforça a leitura de que a guerra fraturou qualquer projeto coletivo, deixando apenas alianças momentâneas voltadas à autopreservação. Bruno, por sua vez, é construído como antagonista cujo interesse não ultrapassa a obtenção do ouro; sua cumplicidade com a barbárie é evidente, mas sempre subordinada à ambição pessoal, o que torna o confronto entre os dois menos ideológico e mais vinculado à disputa por autonomia. A estrutura dividida em capítulos acentua o caráter progressivo da violência, enquanto o desfecho, marcado por uma última confrontação aérea, sintetiza a lógica que conduz todo o filme: quem se mantém de pé no fim é quem encontra sentido concreto na própria persistência.
Avaliação final
“Sisu — Uma História de Determinação” opera dentro de um registro direto, evitando complexidades psicológicas e construindo sua força na clareza do conflito. Jalmari Helander conduz a narrativa com foco absoluto na ação, mas sem eliminar a dimensão histórica que sustenta os personagens. A coerência entre propósito, cenário e ritmo confere ao filme solidez suficiente para que seu exagero não se torne gratuito. A trajetória de Aatami não é apresentada como jornada heroica, mas como consequência de uma existência de perdas contínuas em um território destruído pela guerra. O resultado é uma experiência que combina intensidade, consistência narrativa e uma representação crua da determinação individual diante da violência.
★★★★★★★★★★





