“Alvo da Máfia” é um thriller de ação norte-americano recente, disponível na Netflix. A narrativa acompanha Bang, interpretado por Jack Kesy, um assassino a serviço do chefão do crime Morgan Cutter, vivido por Peter Weller. A trama parte de um ponto direto: Bang executa ordens sem hesitação até ser emboscado e baleado diversas vezes enquanto está em um bar. Contra qualquer expectativa, sobrevive graças a um transplante emergencial, feito após a morte de um homem envolvido em um acidente de carro. O roteiro utiliza esse evento extremo para conduzir Bang a uma espécie de revisão tardia da própria conduta, ainda que o personagem jamais seja apresentado como alguém capaz de cultivar dilemas complexos antes disso.
A lógica central da história é simples: após receber o novo coração, Bang passa a questionar sua lealdade ao crime organizado, aproximando-se de Gwen, interpretada por Marie Broenner, viúva do doador. Paralelamente, fingindo continuar a trabalhar para Cutter, ele desvia as execuções e passa a esconder os alvos em um centro comercial abandonado, que compra usando economias acumuladas no submundo. A narrativa, portanto, se divide entre o disfarce que Bang mantém e a estrutura clandestina que constrói para abrigar quem deveria eliminar.
Por que ver esse filme
O filme entrou na plataforma e é o mais assistido do Brasil na atualidade. Mesmo sem grande repercussão crítica lá fora, ganhou atenção por causa do retorno de Peter Weller a papéis de vilão e da curiosidade do público diante do contraste entre a proposta séria e a execução irregular. A história, apesar das falhas evidentes, gerou comentários justamente por tentar inserir uma mudança radical de caráter em um personagem cuja personalidade inicial mal é estabelecida. O interesse não veio de aclamação, mas do estranhamento que a própria construção dramatúrgica produz.
Essa combinação de expectativa, violência estilizada e estrutura pouco convencional reacendeu a discussão sobre como thrillers de baixo orçamento tentam se distinguir em um mercado saturado. Não se trata de um lançamento marcante, porém o fenômeno de repercutir mesmo sem mérito expressivo justifica a análise.
A experiência
Assisti assim que entrou na Netflix e o que mais chamou atenção foi o contraste entre algumas ideias promissoras e a execução limitada. O início, marcado por um ataque brutal contra Bang, funciona de maneira eficiente. A cena estabelece um ritmo inicial que promete mais do que o filme entrega, mas oferece material suficiente para compreender a dinâmica do personagem com Cutter, cujo gosto por assistir execuções gravadas, sempre com um balde de pipoca em mãos, o transforma no único elemento com personalidade definida.
A partir do momento em que Bang desperta após a cirurgia, a narrativa assume um tom mais contido, quase mecânico. Ele procura informações sobre o doador, passa a seguir Gwen à distância e tenta se aproximar de modo respeitoso, mas sem intimidade emocional aparente. A interpretação de Kesy mantém Bang rígido, tanto antes quanto depois da tentativa de transformação ética, o que impede o filme de demonstrar verdadeira evolução interior.
O que realmente distingue o filme
A escolha de transformar um assassino profissional em protetor involuntário, gerenciando um refúgio improvisado dentro de um centro comercial decadente, cria uma situação inusitada. Os alvos, muitos interpretados por atores que recebem nomes quase caricatos, como Johnny Finger (Steve Bastoni) e Momo (Kane Kosugi), passam a depender de Bang para sobreviver, enquanto Cutter acredita que todos foram eliminados. Esse contraste entre aparência e realidade sustenta o único dinamismo da narrativa.
O confronto final, no qual Bang e os sobreviventes utilizam o próprio ambiente para resistir, tem momentos eficazes, embora não alcance intensidade significativa. No conjunto, “Alvo da Máfia” não se destaca pela construção psicológica nem pela coerência interna, mas pela tentativa de estruturar um enredo que mistura redenção, violência e proteção coletiva de um modo incomum.
O filme acaba chamando atenção não pela força dramática, mas pela estranheza de suas escolhas. É um exemplo de como certas produções conseguem ocupar o debate público mesmo quando seus limites são evidentes.
★★★★★★★★★★



