Uma costureira talentosa trabalha nos bastidores de uma grande revista e cria modelos para corpos que quase nunca ocupam capas. A rotina muda quando o novo gestor decide oxigenar a publicação e se interessa pelo olhar dela para modelagem, conforto e estilo. Em “Amor em Grande Estilo”, essa oportunidade expõe a distância entre slogan e prática: mostrar diversidade no papel é fácil; transformar pauta em roupa disponível para compra exige tempo, investimento e convicção diante do risco comercial.
Dirigido por Michael Robison, o filme tem Jaicy Elliot no papel da criadora e Benjamin Hollingsworth como o executivo que deseja provar competência além do sobrenome. A presença de Candice Huffine, como uma profissional influente do setor, reforça a ponte entre passarela e negócio. O trio sustenta conversas que atravessam vaidade, planilha, responsabilidade social e o que significa de fato considerar o público que não veste tamanhos reduzidos. O elenco coadjuvante ajuda a mapear resistências internas, da redação ao estúdio fotográfico, sem transformar ninguém em caricatura.
O enredo parte de tarefas simples: ajustar uma barra para garantir mobilidade, recortar tecido sem sacrificar caimento, escolher material que não pinique nem marque onde não precisa. Essas decisões, somadas, mudam o desenho de um editorial e a percepção do leitor sobre quem a revista considera seu público. A protagonista, acostumada a vestir amigas e clientes que raramente encontram numeração, insiste que beleza e conforto podem ocupar a mesma peça. O executivo, por sua vez, quer reposicionar a marca sem quebrar contratos com anunciantes que ainda vendem um ideal estreito de corpo.
A câmera adota clareza funcional. Escritórios com vidro e corredores amplos evidenciam a promessa de transparência, enquanto o ateliê e a sala de prova revelam o contrário: a criação nasce do erro, do alfinete que precisa voltar, da conversa que reorienta um desenho. O filme mantém distância suficiente para que se entenda quem faz o quê, evitando confusão entre setores. Quando a cidade aparece, serve como extensão do trabalho: lojas, cafés e táxis viram pontos de passagem onde ideias são testadas na pressa do dia a dia.
O som privilegia texturas do ofício: zíperes, tesouras, máquinas de costura, cliques de câmera, páginas viradas. A música, usada com parcimônia, marca ritmo de criação e momentos de decisão, sem impor euforia ou tristeza fabricada. Esse recuo favorece atenção aos gestos: um ajuste milimétrico no busto, a troca de um botão pelo fechamento mais firme, a numeração ampliada que finalmente cabe em gente de verdade. O resultado aproxima o público do trabalho invisível que antecede qualquer sessão de fotos.
A relação entre os protagonistas avança junto com o projeto editorial. O vínculo nasce de afinidades práticas, ela pensa solução, ele abre espaço, e enfrenta dilemas previsíveis da vida profissional: quem assina a ideia, quem banca a ousadia, quem assume um eventual prejuízo. O roteiro evita transformar o romance em prêmio por comportamento exemplar; é parte de uma rotina que exige concessões. Quando há conflito, ele se liga a escolhas de pauta e cronograma, não a mal-entendidos artificiais.
A discussão sobre representatividade aparece ancorada em decisões verificáveis. Quem define a capa? Qual grade de tamanhos chega às lojas? Como comunicar sem transformar pessoas em tendência? A obra aponta que a mudança depende de departamentos distintos — comercial, produção, redação, fotografia — e de uma cadeia de fornecedores que precisa aceitar volumes diferentes. Há uma ética concreta em jogo: a peça tem de vestir sem dor, e a foto precisa refletir quem a veste no mundo fora do estúdio.
Jaicy Elliot assume o centro com humor discreto e firmeza, evitando o estereótipo da gênia incompreendida. Sua personagem explica técnica com linguagem acessível, pede prazo quando necessário e sabe dizer não a soluções fáceis que apertam onde dói. Benjamin Hollingsworth constrói um gestor que aprende em serviço e entende que modernizar não é só atualizar discurso; envolve disputar orçamento, convencer acionistas e proteger a equipe no embate com patrocinadores. Candice Huffine empresta presença segura às cenas em que experiência de passarela se cruza com estratégia de negócio.
O filme acerta ao dar visibilidade ao trabalho coletivo. A edição impressa e sua versão digital nascem da soma de funções: pesquisa, styling, foto, revisão, negociação de créditos. Pequenas vitórias ganham espaço, como a ampliação do número de manequins na sessão e a decisão de informar medidas com clareza. Há tropeços, como a tentação de mascarar curvas com cortes agressivos ou de escolher ângulos que disfarçam o corpo. Sempre que isso acontece, a protagonista argumenta com prova material: quando a roupa acomoda movimento, a imagem melhora e vende sem trair quem a veste.
A encenação evita apontar culpados abstratos. O problema não é uma pessoa; é um sistema que premiou por décadas um padrão único e agora tenta manter lucro enquanto atualiza imagem. Nesse contexto, o romance não serve para resolver conflito social; funciona como espaço de confiança mínima para que alguém consiga sustentar uma proposta dentro da empresa. A obra, então, afirma a necessidade de continuidade: inclusão não cabe em um editorial isolado, exige calendário, fornecedores e disposição permanente para revisar o que ficou confortável demais.
“Amor em Grande Estilo” encontra equilíbrio entre fantasia e trabalho. Há encontros afetivos, mas também e-mails difíceis; há vestidos bonitos, mas também orçamento curto. O filme respeita a inteligência do público ao mostrar que transformação precisa sair da frase motivacional e entrar na planilha. Quando o número ampliado chega à arara e a equipe assume o compromisso de mantê-lo disponível, a ideia deixa de ser apenas desejo e vira prática verificável, condição mínima para que o discurso de inclusão faça sentido fora da página.
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