“Hitch — O Conselheiro Amoroso” é um exemplo emblemático de comédia romântica que, mesmo sem reinventar o gênero, compreende perfeitamente as regras do jogo. Andy Tennant dirige uma narrativa que se apoia em uma estrutura clássica: o especialista em sedução que domina todas as técnicas, mas fracassa diante da própria vulnerabilidade. O mérito do filme está menos na história em si, um roteiro construído sobre fórmulas seguras, e mais na maneira como lida com a performance carismática de Will Smith, que transforma um arquétipo em figura de humanidade tangível.
Alex “Hitch” Hitchens é o “doutor dos encontros”, um homem que ganha a vida ensinando outros homens a conquistar mulheres. O conceito em si carrega um cinismo evidente, o amor reduzido a método, o afeto transformado em mercadoria, mas o filme evita mergulhar nesse lado mais incômodo. Em vez disso, opta por uma moral ligeiramente otimista: a de que até o manipulador profissional é, em última instância, refém da própria emoção. Essa escolha revela tanto as limitações quanto as virtudes da direção de Tennant. Há uma recusa deliberada do risco; tudo é construído para soar confortável, desde a fotografia ensolarada de Nova York até o ritmo musical do roteiro, que mantém o público num estado de leve e constante satisfação.
Ainda assim, “Hitch” funciona. Funciona porque há ritmo, timing e um equilíbrio raro entre comédia física e afeto genuíno. Kevin James, como o desajeitado Albert, é o contraponto perfeito ao protagonista, seu humor é ingênuo, quase pueril, e expõe o contraste entre a técnica e a autenticidade. O filme ganha força justamente quando abandona a lógica do manual e se permite um breve momento de descontrole emocional. A química entre Smith e Eva Mendes não é incendiária, mas é suficientemente honesta para sustentar a premissa central: o amor não é uma ciência exata, e toda tentativa de domá-lo resulta em comédia.
O problema está no terceiro ato, quando o roteiro, temeroso de se afastar demais da convenção, cede ao velho ciclo de mal-entendidos e reconciliações. Nesse ponto, o filme trai a própria lucidez inicial. O que era uma sátira sobre as máscaras sociais do namoro transforma-se em moralidade previsível, como se o estúdio precisasse garantir que ninguém saísse do cinema sem a lição aprendida. A quebra de coerência não destrói o conjunto, mas o torna menos memorável do que poderia ser.
“Hitch” não é um filme revolucionário, tampouco pretende ser. Sua honestidade é, de certo modo, sua virtude: ele entrega o que promete e o faz com habilidade. No fundo, há algo filosófico em sua simplicidade, a constatação de que o amor, quando racionalizado, se torna ridículo, mas que a tentativa de entendê-lo é, paradoxalmente, o que nos torna humanos. Entre a previsibilidade e o encanto, o filme se mantém num território curioso: o da leveza pensada, onde o entretenimento não ofende a inteligência e o riso não exclui a reflexão.
★★★★★★★★★★

