Fins de semana são, na prática, um acordo tácito entre a vontade de sair e a permissão de não fazer nada. Às vezes, o mundo lá fora parece exigir presença — mas, em outras, basta um motivo mínimo para que o sofá se torne território firme. Nesta semana, a Netflix fez um movimento que nem foi tão barulhento assim, mas foi certeiro: colocou lado a lado quatro filmes que, cada um à sua maneira, oferecem mais do que ocupação. Eles criam uma pausa legítima. E quando a pausa vem com densidade, talvez a gente nem chame mais de distração. “O Terminal”, que retornou ao catálogo, é um desses casos raros em que a doçura vem sem açúcar e a crítica social se disfarça de cotidiano absurdo. Spielberg, com a calma que poucos diretores ainda cultivam, transforma um espaço de espera num campo de resistência silenciosa. “Spotlight”, por sua vez, faz o caminho inverso. É ruído que começa baixo e vai crescendo — não em decibéis, mas em urgência. É jornalismo, sim. Mas é também sobre o tempo que leva até alguém ter coragem de dizer em voz alta o que todo mundo já sabe. E então há “Gladiador II”, estreia absoluta, que retorna à arena sem tentar imitar Maximus. Paul Mescal entrega outra coisa: um tipo de herói em disputa com o próprio passado, que sangra por dentro mais do que pelas lanças. Ridley Scott, mesmo 24 anos depois, ainda filma como quem tem algo a provar. E, entre batalhas e investigações, vem “Meu Ano em Oxford” — leve só na superfície. Por trás da fotografia limpa e da juventude britânica embalada em rotina acadêmica, existe uma história sobre escolhas que não cabem em planilhas de futuro. E sobre como amar alguém pode significar deixá-lo ir. O curioso é que esses quatro filmes não combinam entre si. Mas combinam com a sensação vaga de que há dias em que o mundo pede ruído — e outros em que basta um bom roteiro para lembrar por que ainda vale a pena parar. Não porque não haja o que fazer lá fora. Mas porque, por duas horas, aqui dentro, parece fazer mais sentido.

“Meu Ano em Oxford”, adaptação do romance de Julia Whelan, é uma comédia romântica com ambições dramáticas, dirigida por Iain Morris. Sofia Carson interpreta Anna De La Vega, jovem americana promissora que conquista uma cobiçada bolsa para estudar poesia vitoriana em Oxford. Ao chegar à universidade, ela se depara com tradições rígidas, expectativas acadêmicas sufocantes e um ambiente emocionalmente contido. Lá, conhece Jamie Davenport, vivido por Corey Mylchreest, um estudante britânico carismático com quem desenvolve uma relação intensa e, aos poucos, complexa. Quando um segredo sobre Jamie vem à tona, Anna é forçada a confrontar seus planos, seus sentimentos e suas escolhas. O filme investiga os limites entre ambição pessoal e entrega afetiva, equilibrando leveza narrativa com momentos de introspecção. Dougray Scott e Catherine McCormack completam o elenco, dando densidade ao núcleo familiar inglês. “Meu Ano em Oxford” é um drama romântico que trata o crescimento como movimento de ruptura, não de conciliação.

“Gladiador II”, aguardada continuação do clássico de 2000, retoma o legado de Maximus através de uma nova geração. Dirigido por Ridley Scott, o filme acompanha Lucius Verus, agora adulto, vivido por Paul Mescal. Exilado na Numídia após os eventos do primeiro longa, ele é capturado durante uma invasão romana e forçado a lutar como gladiador. Seu caminho cruza com o de Macrinus, personagem de Denzel Washington, um poderoso comerciante de gladiadores com ambições sombrias. Lucius precisa enfrentar o passado imperial que carrega, enquanto lida com dilemas de identidade e justiça. Connie Nielsen retorna como Lucilla, mãe de Lucius, e Pedro Pascal assume o papel do general Acacius. Com fotografia monumental e batalhas grandiosas, o filme não apenas revisita a arena, mas amplia o conflito político e íntimo dos personagens. “Gladiador II” mantém o peso épico do original e atualiza a linguagem visual e moral para um novo tempo, sem perder densidade.

“Spotlight: Segredos Revelados”, dirigido por Tom McCarthy, é um dos mais impactantes retratos do jornalismo investigativo no cinema contemporâneo. Baseado em fatos reais, o filme acompanha a equipe Spotlight do jornal Boston Globe, que revelou um escândalo sistêmico de abuso sexual infantil encoberto por décadas pela Arquidiocese de Boston. Michael Keaton interpreta Walter “Robby” Robinson, editor do grupo, ao lado de Mark Ruffalo como Michael Rezendes e Rachel McAdams como Sacha Pfeiffer. O roteiro é construído com rigor documental e atenção ética, evitando dramatizações exageradas e confiando na força dos fatos. A investigação jornalística avança entre arquivos, silêncio institucional e o peso emocional dos depoimentos. O elenco entrega performances contidas e contundentes, reforçando a gravidade do material. “Spotlight” venceu o Oscar de Melhor Filme e continua atual por seu compromisso com a verdade e a denúncia, mostrando o jornalismo como pilar ético fundamental frente ao poder que prefere a escuridão ao escândalo.

Em “O Terminal”, Steven Spielberg transforma um aeroporto em fábula contemporânea sobre burocracia, humanidade e dignidade. Tom Hanks interpreta Viktor Navorski, um homem de Krakozhia que fica preso no Aeroporto JFK após um golpe militar tornar inválidos os documentos de seu país. Sem autorização para entrar nos Estados Unidos nem para voltar para casa, Viktor improvisa moradia dentro do terminal. Lá, estabelece vínculos improváveis com funcionários, incluindo a comissária de bordo Amelia Warren, vivida por Catherine Zeta-Jones, e enfrenta o rígido diretor de segurança Frank Dixon, interpretado por Stanley Tucci. O filme combina precisão emocional com um senso de humor melancólico e discreto, refletindo sobre pertencimento, paciência e resiliência. Spielberg conduz a narrativa com ritmo delicado, evitando caricaturas fáceis e transformando o absurdo da situação em algo poeticamente plausível. “O Terminal” é mais do que uma comédia dramática: é um elogio à perseverança e à gentileza em um mundo regido por regras sem alma.