Chamam de burro, mas ninguém para de ver: o filme de ação que segue imbatível na Netflix Divulgação / Universal Pictures

Chamam de burro, mas ninguém para de ver: o filme de ação que segue imbatível na Netflix

Vin Diesel, como Dominic Toretto, já não interpreta apenas um personagem: ele sustenta um ícone. Em seu décimo filme, a franquia “Velozes e Furiosos” mantém a estrutura que a consagrou — perseguições espetaculares, discursos emotivos e lealdades inquebrantáveis —, mas mostra claros sinais de cansaço. Leterrier assume a direção após a saída de Justin Lin e opta por não arriscar. Em vez de tentar inovar, reproduz os elementos mais reconhecíveis da série, num esforço de continuidade que beira a repetição automática.

O roteiro, assinado por Zach Dean, Justin Lin e Dan Mazeau, inicia com Dom transmitindo ao filho Brian uma série de conselhos sobre vida, coragem e família. A sequência, que poderia funcionar como transição geracional, perde força diante da insistência no tom melodramático, presente ao longo de todo o filme. A relação entre pai e filho é tratada como símbolo máximo da narrativa, mas pouco evolui ao longo das mais de duas horas de projeção.

Leterrier, conhecido por sua condução ágil e preferência por sequências de ação, não se distancia desse estilo. Ele investe fortemente nas cenas de perseguição e confronto, distribuídas de maneira a preencher todos os intervalos possíveis entre os diálogos emocionais. A montagem, acelerada e fragmentada, reforça o ritmo contínuo do filme, mas dificulta qualquer aprofundamento dramático. O tom épico é sugerido, mas nunca alcançado de fato.

Entre os poucos elementos que se destacam está a atuação de Jason Momoa como Dante Reyes. Seu personagem, marcado por uma amargura quase caricatural, introduz um tom mais histriônico à trama. Momoa explora o lado instável e impulsivo de Dante com uma liberdade que contrasta com a rigidez de Diesel. Em diversos momentos, o vilão parece rir da própria situação, oferecendo ao filme um respiro de imprevisibilidade. Há também nuances que sugerem certo homoerotismo na relação entre Dante e Toretto, uma escolha sutil de direção que, embora não desenvolvida, quebra minimamente o tom monocromático do enredo.

O restante do elenco repete as participações já familiares ao público, com personagens que transitam entre breves aparições e retornos não explicados. A ideia de “família”, central desde o primeiro filme, continua sendo o eixo narrativo. Contudo, à medida que novas conexões surgem e antigos aliados retornam, o conceito se dilui e perde impacto. A repetição da palavra e das situações que a envolvem parece mais uma exigência do roteiro do que um desenvolvimento orgânico da história.

O filme também dá sinais de que a saga se aproxima de uma transição, ainda que hesitante. Com o subtítulo “Parte 1”, “Velozes e Furiosos 10” prepara o terreno para um desfecho prometido e adiado. A continuação, prevista para 2025, reforça a sensação de que o encerramento real ainda está distante. Não há aqui a tentativa de encerrar um ciclo, mas de prolongá-lo o máximo possível.

As referências aos capítulos anteriores são constantes, sobretudo ao quinto filme, ambientado no Brasil, de onde parte a motivação de Dante. Essa retroalimentação interna é uma estratégia que reforça a coesão entre os episódios, mas também limita a autonomia da obra. É difícil entender este filme como unidade narrativa; ele depende demais da memória afetiva construída nos episódios anteriores.

Do ponto de vista técnico, a produção mantém o padrão elevado que caracteriza a série. Os efeitos visuais, a trilha sonora intensa e a fotografia marcada por contrastes seguem em sintonia com o que se espera de um blockbuster. No entanto, esse apuro técnico não basta para sustentar o interesse por um filme que parece funcionar no automático. A sensação é de que se assiste a mais uma repetição de uma fórmula já conhecida, com pequenas variações de tom ou locação.

Há momentos isolados que funcionam, especialmente nas interações entre Dom e o filho, mas esses trechos não são suficientes para reverter a impressão de desgaste. A carga emocional que se tenta atribuir às relações parece forçada, sem o suporte de um roteiro consistente. Os personagens se movem por motivações simples, resumidas a vingança, proteção e dever familiar.

“Velozes e Furiosos 10” não tenta reinventar a série, e talvez nem precise. Com uma base de fãs consolidada e uma bilheteria previsivelmente alta, o filme cumpre o papel de manter viva a franquia. O risco, no entanto, é que essa manutenção se torne apenas um exercício de repetição. E que, ao invés de consolidar um legado, contribua para sua diluição.

Filme: Velozes e Furiosos 10
Diretor: Louis Leterrier
Ano: 2023
Gênero: Ação/Aventura/Crime/Thriller
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★