A literatura canônica é, para muitos leitores, um território sagrado. Repleto de obras que moldaram o pensamento ocidental, definiram estilos e influenciaram gerações, esse universo é respeitado — às vezes até com certo temor. No entanto, é inegável que nem todos os clássicos são acessíveis, envolventes ou prazerosos à primeira leitura. Para alguns, eles são sinônimo de admiração; para outros, de bocejos intermináveis. Mas o que faz com que certos livros clássicos deem sono? Seriam seus estilos datados, as tramas lentas ou as descrições intermináveis? Muitos clássicos foram escritos em períodos em que a literatura seguia convenções diferentes das atuais. Frases longas, vocabulário rebuscado e construções sintáticas complexas sem dúvida podem dificultar a absorção do que vai ali escrito.
É justo perguntar: um livro precisa ser “interessante” ou “empolgante” para ser bom? A resposta pode ser mais filosófica do que parece. Há livros que cativam pelo enredo, outros pelo estilo, e alguns apenas pelo desafio intelectual que representam. A sonolência que alguns causam pode ser fruto não de um defeito, mas de uma diferença de expectativa. Um leitor que busca uma história dinâmica e clara talvez se frustre com os desvios de Ulisses, mas esse mesmo livro pode fascinar alguém que procura explorar os limites da linguagem. Livros clássicos que dão sono não são necessariamente ruins — pelo contrário. Muitos deles são marcos na história da literatura, responsáveis por transformações profundas na forma de narrar, pensar e sentir. No entanto, é saudável reconhecer que a leitura desses textos nem sempre é prazerosa ou acessível. Perder-se nos monólogos de ”Os Irmãos Karamázov” (1880), de Dostoiévski, não é sinal de cognição deficiente ou fracasso moral, mas talvez um convite para ler em outro momento, com outra disposição. Afinal, a literatura é também uma jornada pessoal — e algumas estradas são mais sinuosas do que outras.
Nessa lista, apontamos as contradições de alguns dos grandes títulos da literatura universal, indo da primeira metade do século 19, caso de “O Vermelho e o Negro” (1830), de Stendhal (1783-1842), ao muitíssimo controverso “O Apanhador no Campo de Centeio” (1951), de J.D. Salinger (1919-2010), motivo da tal vergonha alheia por parte de um gênio indomável como Elizabeth Bishop (1911-1979). Frise-se que a experiência é absolutamente pessoal, e que sempre há em cada um desses cinco títulos lances memoráveis, cuja relevância fundamental é também empurrar o público para outros livros, a fim de que compare, analise e proponha-se a buscar o que pode haver de melhor. É sempre há muito o que se descobrir entre páginas e notas de rodapé.

Elizabeth Bishop (1911-1979) nunca conseguiu terminar “O Apanhador no Campo de Centeio”, tamanha era a vergonha por seu autor. E, sim, o romance mais famoso de J.D. Salinger, decepciona. A narrativa é arrastada e centrada em um protagonista, Holden Caulfield, cuja constante reclamação e atitude cínica tornam a leitura cansativa. A falta de enredo consistente pode deixar a impressão de que o livro gira em círculos, sem chegar a lugar algum. Holden é muitas vezes irritante, repetitivo e pouco evolui ao longo da história, o que compromete o envolvimento emocional do leitor. Além disso, a linguagem informal e os jargões usados de forma excessiva tornam a leitura monótona. O texto parece mais uma longa lamentação do que um romance bem estruturado. A ausência de personagens secundários cativantes também contribui para a sensação de superficialidade. A obra tenta criticar a hipocrisia social, mas o faz de forma juvenil e pouco impactante. Não há um verdadeiro clímax ou resolução, o que deixa o leitor com a sensação de que o livro termina sem propósito. Em muitos momentos, parece que o autor depende apenas da “voz” de Holden para sustentar a obra. Embora seja considerado um retrato da angústia adolescente, falha em oferecer profundidade e reflexão significativas. É possível que sua fama seja mais fruto do contexto histórico de seu lançamento do que de seu real valor literário. A leitura pode ser frustrante para quem espera um desenvolvimento mais maduro ou introspectivo. Em resumo, é um livro superestimado, cuja relevância hoje é, no mínimo, questionável.

“O Amante de Lady Chatterley” é uma obra que, apesar de sua fama, decepciona em vários aspectos. A narrativa é arrastada, com descrições excessivas que muitas vezes tornam a leitura enfadonha. O enredo, centrado no caso extraconjugal entre Lady Chatterley e o guarda-caça Mellors, carece de profundidade e originalidade, parecendo mais uma tentativa de escandalizar do que de explorar temas humanos com sensibilidade. As motivações dos personagens são rasas e pouco convincentes, especialmente a protagonista, que oscila entre a apatia e a paixão de maneira inverossímil. A crítica social que Lawrence tenta inserir é superficial e didática, interrompendo a fluidez do texto. A linguagem, por vezes poética, frequentemente resvala no vulgar, e o erotismo, ao invés de ser sofisticado, beira o grosseiro. Mellors é um personagem idealizado de forma simplista, quase caricatural, enquanto Clifford Chatterley é reduzido a um símbolo estereotipado da impotência e da elite decadente. A obra envelheceu mal, e o impacto que teve no início do século 20 não se sustenta nos padrões literários contemporâneos. Em suma, trata-se de um romance superestimado, mais lembrado por sua controvérsia do que por seus méritos literários.

“O Grande Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald, é frequentemente aclamado como um clássico da literatura americana, mas apresenta várias falhas notáveis que comprometem sua eficácia. A narrativa é lenta e, em muitos momentos, arrastada, com excesso de descrições e pouca ação concreta. A história gira em torno de personagens vazios, fúteis e moralmente questionáveis, dificultando qualquer identificação ou empatia por parte do leitor. Jay Gatsby, o protagonista, é idealizado de forma exagerada, tornando sua obsessão por Daisy mais patética do que romântica. A superficialidade dos diálogos e a falta de desenvolvimento emocional dos personagens reforçam a sensação de distanciamento. A crítica social pretendida sobre o sonho americano se perde em uma trama repetitiva e monótona, que falha em aprofundar suas questões centrais. A narração por Nick Carraway, supostamente neutra, é inconsistente e pouco confiável, tornando difícil confiar em sua perspectiva. Além disso, o livro parece mais preocupado em criar um retrato estilizado da elite dos anos 1920 do que em oferecer um enredo sólido. O desfecho previsível e anticlimático não compensa a lentidão da narrativa. No geral, “O Grande Gatsby” é superestimado, mais celebrado por sua aura literária do que por seu conteúdo real.

“A Letra Escarlate”, de Nathaniel Hawthorne, é frequentemente criticado por seu ritmo excessivamente lento e estilo narrativo denso, o que pode tornar a leitura arrastada e desestimulante para muitos leitores. A linguagem arcaica e rebuscada dificulta o entendimento, afastando o público moderno. A trama, centrada na punição moral de uma mulher adúltera na rígida sociedade puritana, é repetitiva e marcada por uma visão moralista cansativa. Os personagens são unidimensionais e pouco cativantes, especialmente Hester Prynne, cuja passividade frente às injustiças pode parecer incoerente e frustrante. O reverendo Dimmesdale, por sua vez, é excessivamente atormentado, tornando sua culpa mais enfadonha que trágica. O antagonista Chillingworth é caricatural e previsível. A crítica social do livro é rasa, focando em condenações óbvias ao puritanismo sem oferecer reflexões mais profundas ou complexas. O simbolismo, como o da letra “A”, é usado de forma repetitiva e forçada, perdendo impacto ao longo da narrativa. As descrições longas e minuciosas tiram dinamismo da história. O final é anticlimático e pouco satisfatório. No geral, o livro carece de emoção genuína e entrega uma crítica moral superficial, envolta em prosa cansativa e personagens esquecíveis.

“O Vermelho e o Negro”, de Stendhal, apesar de ser considerado um clássico da literatura francesa, apresenta uma narrativa arrastada e excessivamente descritiva, que pode tornar a leitura enfadonha. O protagonista, Julien Sorel, é um personagem ambíguo e, por vezes, antipático, cujas ambições e atitudes geram pouca empatia no leitor. A trama, centrada na ascensão social através da hipocrisia e da manipulação, carece de dinamismo e parece perder força em diversos momentos. A linguagem, rebuscada e cheia de digressões filosóficas, dificulta o envolvimento com a história. O romance se prolonga em reflexões morais e políticas que, embora relevantes para a época, soam datadas e desconectadas da realidade atual. A crítica social, embora presente, é diluída em longos diálogos e monólogos internos cansativos. As personagens femininas, como Madame de Rênal e Mathilde, são mal desenvolvidas, sendo retratadas mais como instrumentos da ambição de Julien do que como figuras com profundidade própria. O final trágico, ainda que dramático, parece previsível e pouco impactante. A estrutura narrativa não apresenta grandes surpresas e a evolução dos personagens é inconstante. A obra pode frustrar leitores modernos em busca de ritmo e emoção.