Os 5 melhores livros de Dostoiévski

Os 5 melhores livros de Dostoiévski

Na novela “O Duplo” (1846), de Fiódor Dostoiévski (1821-1881), o conselheiro Goliádkin é obrigado a enfrentar uma questão esdrúxula. Um seu sósia aparece sem explicação pelas ruas de São Petersburgo, e aí começa para esse homem pacato uma descida ao inferno. O argumento dos doppelgängers, figuras que reproduzem à perfeição a aparência física de alguém sem apresentar nenhum vínculo biológico, é uma das ideias de desvario, sobre a qual o russo ancorou boa parte de sua obra, tentando, como homem de gênio que era, entender até onde podem ir os desejos, irracionais quase sempre, do espírito do homem. A loucura sempre permeou a humanidade. O homem vai perdendo a razão aos poucos, incapaz frente aos muitos desafios que a vida lhe impõe, ou o desatino o colhe de uma vez, consequência de muitos anos de uma existência fracassada. Dostoiévski não chegou a enlouquecer, mas esteve parede a parede com a insanidade. Ourives de preciosidades da literatura universal, o escritor era um homem descrente do gênero humano, e flutua no éter da polêmica sua suposta conversão a um pretenso amor por tudo e por todos.

Dono de uma inteligência extraordinária, capaz de conduzir o leitor por um labirinto de pensamentos que sugere completamente irrefutáveis só para, logo, a seguir, botá-los todos à prova, Dostoiévski segue inquietando leitores do mundo todo e todas as épocas, atropelando preconceitos, dogmas ou o que quer que críticos quisessem dele. “Memórias do Subsolo” (1864) é o romance de formação por excelência de Dostoiévski, mas como não lembrar de “O Jogador” (1866) e “Os Irmãos Karamázov” (1879), que lançam o público sem rodeios no universo de seu autor? Dostoiévski é cada vez mais necessário num mundo distópico, caótico, moldado pelos valores invertidos que passam a definir as relações. Pessimismo, conversão, mudança de vida, medo: nada foge ao olhar arguto de Dostoiévski, que não se furta a cascavilhar as chagas da existência em seus romances e contos, tão ricos que sempre tratam de reservar surpresas e suscitar revelações, não importa quantas vezes já os tenhamos lido. Figuram na nossa lista, junto com “Memórias do Subsolo”, “O Jogador” e “Os Irmãos Karamázov”, outros dois motivos de Dostoiévski seguir relevante neste insano século 21, uma era de comunicação ininterrupta, mas (ou por isso mesmo) desencontrada, o que em suas mãos acabaria também em mais um romance matador.

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.