7 filmes no streaming que vão salvar o seu feriado (e talvez sua fé no cinema) Divulgação / A24

7 filmes no streaming que vão salvar o seu feriado (e talvez sua fé no cinema)

Depois de certa idade, pulsa na carne de toda mulher e de todo o homem a certeza de que a vida é de fato um mistério, e circunstâncias inexplicáveis — e não raro sinistras — sempre hão de sobrepujar a jornada de cada um em determinado momento, numa frequência insana que o organismo só tolera porque amalgama essa substância incorpórea que absorvemos do mundo ao caos que tem em si por natureza, vindo sabe Deus de que universo paralelo a este, onde é tudo breu, silêncio e harmonia.

A dada altura da vida, o existir parece imerso num caldo untuoso que interdita-nos qualquer movimento, dando a sensação de que a realidade deu lugar a uma condição muito específica, como se um sonho, longo, fadigoso, que drena as energias de quem dorme e tenta, em vão, forjar aquelas imagens a seu talante. Ao notar, finalmente, que está encarcerado a memórias de que deveria livrar-se — malgrado jamais possa —; de que sua história até ali, em maior ou menor grau, há de manifestar alguma influência sobre os rumos que toma agora; de que está a reboque dos desmandos de seu próprio pensamento, no labirinto nebuloso de sua cabeça tão instável, cabe ao homem apenas convencer-se de que viver é mesmo a cornucópia de delírios que lhe parecia desde tenra idade. E fazer doce o naufragar-se nesses mares, como aconselha o poeta italiano Giacomo Leopardi (1798-1837).

Com alguma assiduidade, somos desafiados a encontrar motivos para ratificar nossa crença no existir, passando por cima de todo o desalento que embrutece e paralisa; de toda a melancolia, que na dose imprópria, deixa nebuloso o céu da reflexão e avança ao pântano da dúvida imanente e ubíqua, acerca de qualquer um e em qualquer parte; de tudo quanto tenta nos demover do sonho de dias menos sombrios e gente mais risonha, o ideal mais singelo e mais intricado a que se pode aspirar. Num só movimento, viver torna-se uma sucessão de luzes e sombras que se atraem e se repelem e se equivalem, subidas e descidas bruscas e repentinas como num brinquedo macabro, entradas e saídas de labirintos claustrofóbicos que se estreitam ainda mais conforme tomamos pé de nossas humanas limitações, agudizando a impressão de que no espírito do homem cabem mesmo todos os sonhos do mundo, mas nele encrustam-se igualmente muitas das côdeas que enxovalham o mundo para muito além da vã filosofia deste plano tão rasteiro.

O que não tem explicação, o que não tem nome, muito do que a razão não alcança, pauta a narrativa dos sete filmes que compõem a lista abaixo, protagonizados por homens que, bem ou mal, encarnam o arquétipo do salvador americano, e, por evidente, tomam forma naquelas terras encravadas em planícies entre montanhas a perder de vista, longe do mar e do céu e banhadas por um dourado que, por si só, já nos recompensa. Cada um dos sete filmes desta lista contém, cada qual a seu modo, a mensagem tão enigmática quanto assertiva de resiliência, busca por evolução, alento em gestos simples, em personagens que, em uma ou outra circunstância, nem sempre conseguem escapar a algum revés.

Em “Mickey 17” (2025), Bong Joon-ho continua a se provar um dos cineastas mais criativos e sofisticados da indústria mundial ao narrar a história de um infeliz que talvez passe a eternidade nascendo e morrendo só para livrar multimilionários de vírus e outras ameaças num novo planeta. Já com “A Última Showgirl”, Gia Coppola pretende fazer uma justa homenagem a Pamela Anderson, que, ao encarnar uma vedete em fim de carreira, volta a lances feéricos e lúgubres de sua própria vida diante dos holofotes, que fizeram-na uma estrela mediante renúncias e humilhações silenciosas. Excelentes pedidas para o feriado ou a qualquer tempo.

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.