Filme com George Clooney e Nicole Kidman na Netflix vai mantê-lo na ponta do sofá até o último segundo Divulgação / UIP

Filme com George Clooney e Nicole Kidman na Netflix vai mantê-lo na ponta do sofá até o último segundo

A Guerra Fria (1947-1991) deu azo a toda sorte de filmes, e Mimi Leder foi um dos cineastas que soube tirar bom proveito da onda de paranoia e ultranacionalismo em que o povo americano se embebeu quando do término oficial das hostilidades entre Estados Unidos e União Soviética, no dia de Natal de 1991.

Evidentemente, soviéticos não abdicaram de mais de quatro décadas de ódio refervido, metamorfoses econômicas e constantes embaraços no que tange a sua identidade num simples virar de página do imenso livro da História, e, assim, tramas feito a de “O Pacificador” não são de todo absurdas. Com o roubo de armas nucleares por um terrorista iugoslavo depois da colisão de dois trens no interior da Rússia (!), o texto de Andrew e Leslie Cockburn e Michael Schiffer dão a partida numa história crível em se tomando a vida como ela é, mas delirante sob a perspectiva da ficção.

No primeiro grande lançamento do estúdio DreamWorks, fundado três anos antes, Leder escolhe dois astros incontornáveis da indústria do cinema para que cada um ancore um lado de uma mesma disputa. George Clooney encarna um herói militar um tanto misógino que se junta à talentosa burocrata vivida por Nicole Kidman, e unidos (bem, essa não é a melhor palavra para definir a relação dos dois) precisam quem está por trás do sumiço das tais ogivas, isto é, para quem o bandido iugoslavo trabalha.

O trio de roteiristas arrisca um golpe de corajosa originalidade ao mencionar que o criminoso teria ascendência bósnia e estaria tomado de fúria com o descaso da comunidade internacional diante do cerco a Sarajevo, aludindo também, a voo de pássaro, ao Massacre de Srebrenica, no leste do país, quando mais oito mil homens e meninos muçulmanos foram assassinados por homens do exército bósnio da Sérvia, comandado pelo general Ratko Mladić, aliado aos Escorpiões, uma facção paramilitar sérvia.

Julia Kelly, a chefe interina do Grupo de Contrabando Nuclear da Casa Branca, e Thomas Devoe, um oficial de inteligência das Forças Especiais do Exército, a elite da defesa nacional, caçam Dusan Gavrich, o extremista de Marcel Iures, que por seu turno não fica imune a lembranças de seus parentes trucidados.

A partir do segundo ato, resta patente a razão da agonia de Kelly e Devoe. Gavrich quer detonar o material que surrupiara numa rua de Manhattan, e ainda deu-se ao trabalho de produzir um vídeo no qual argumenta que não é nenhum monstro; apenas deseja chamar a atenção das cabeças iluminadas do planeta para a perseguição étnica de sua gente, o que, felizmente, não amolece o coração do anticasal de altos funcionários da América.

“O Pacificador” se perde em questões histórico-militares quando não precisaria. Em certa quadra da narrativa, já na iminência da conclusão, uma turma de crianças, membros de um pequeno coral escolar, são removidas às pressas enquanto a antimocinha de Kidman tenta neutralizar o petardo. Em mãos mais hábeis, esse seria o gancho perfeito para que Kelly passasse uma merecida descompostura em Devoe, respiro cômico urgente, à “A Gata e o Rato” (1985-1989), de Glenn Gordon Caron, para um enredo pretensioso demais.


Filme: O Pacificador
Direção: Mimi Leder 
Ano: 1997
Gêneros: Ação/Thriller|
Nota: 7/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.