Pensar que existe uma receita para que mulheres e homens de origens, culturas, visões de mundo as mais diversas entendam-se quase sempre, restando uma ou outra ponta por arredondar ao longo de um relacionamento de décadas é de uma ingenuidade quase comovente, e é assim que ditos especialistas, os coaches na terminologia da moda, solidificam carreiras que, no mundo real, não resistiriam a uma sabatina de pesquisadores de fato comprometidos com o tema — e erigem uma monumental fortuna. Relações podem ser foco de aprendizado para gente madura justamente porque tocam em pontos deveras sensíveis das emoções menos óbvias, e é aí que “Pense como Eles” consegue, afinal, sair de uma bastante previsível e oferecer elementos para que o público se envolva com o que é contado. Tim Story lança de mão de quase todos os recursos narrativos do metódico roteiro de David A. Newman e Keith Merryman a fim de torcer uma ideia tão simplória a ponto de ofender a inteligência de quem assiste até que dela escorra uma pletora de bons conflitos, sobretudo no terceiro ato, depois que Newman e Merryman cumprem todas as tediosas etapas do que soa como um protocolo, que congela e empobrece a história em grande medida, e alcançam a proeza de, ainda assim, rascunhar a psicologia dos tipos que a compõem.
Rituais para a afirmação da masculinidade foram consolidando-se no transcurso da jornada do gênero humano, e meninos, por mais inseguros que possam se revelar, precisam tornar-se homens mais cedo ou mais tarde. Story trabalha essa máxima tão feliz do texto de seus roteiristas na intenção de frisar o contrassenso na postura dos marmanjos que protagonizam seu filme, todos padecendo de algum grau, de moderado a severo, da incapacidade de comprometer-se com uma mulher. Grande parte da culpa, segue o diretor, é da internet, que proporciona todas as combinações de parceiras que se imagine — desde que se esteja de acordo quanto a manter o caso a uma distância bastante restrita. A mulher pode até ser inconstante como uma pluma ao vento, como escreveu Giuseppe Verdi (1813-1901) em “Rigoletto” (1851), mas homens não ficamos atrás. Casados podem ser felizes, mas a tentação de uma vida muito mais excitante persegue sujeitos como Cedric, o anfitrião pelo qual os outros seis personagens masculinos vêm à superfície. Kevin Hart encarna o típico baixinho folgazão, que ao termo de um casamento morno decide recuperar o tempo perdido lançando flertes a todo rabo de saia que se lhe aproxima, querendo (e às vezes exigindo) que os amigos o acompanhem. Isso seria absolutamente normal, não fosse estarem cada qual numa quadra muito própria da vida. Michael, o personagem de Terrence Jenkins, por exemplo, gasta uma fração generosa das duas horas de projeção tentando entender-se com Candace, de Regina Hall, enquanto Dominic, o galã vivido por Michael Ealy, precisa firmar-se no mundo corporativo se quiser ter alguma chance com Lauren, a executiva predadora de Taraji P. Henson, que não está disposta a namorar a sério ninguém cujo holerite não atinja os seis dígitos. Parecido com ele só Alex, o aprendiz de cafajeste que Chris Brown tira de suas experimentações reais, pulando de cama em cama até se deparar com Mya, papel de Meagan Good, uma moça que sabe perfeitamente o que quer, mas ainda se ilude com as confusas promessas de amor de garotos espertos.
No segundo ato, “Pense como Eles” perde muito do vigor com a equivocada decisão de incluir menções a Steve Harvey, um comediante e radialista subitamente alçado a condição de celebridade em 2009 graças a “Act like a Lady, Think like a Man” (“aja como uma senhora, pense como um homem”, em tradução literal), com o seguinte título complementar: o que os homens realmente pensam sobre amor, relacionamentos, intimidade e compromisso. Essa desnecessária lembrança ao autor e seu livro, por várias semanas consecutivas nas listas de best-sellers dos principais veículos impressos dos Estados Unidos, com direito a imagens da entrevista de Harvey a um programa de auditório, fede a uma estabanada campanha de promoção do volume, uma compilação de recomendações e advertências para damas ávidas por matrimônio. A emenda fica pior que o soneto no instante em que se nota que não se vai falar nada acerca de “Act Like a Gentleman, Think Like a Woman” (“aja como um cavalheiro, pense como uma mulher”), a resposta de Maria Bustillos a Harvey, que não parou na primeira incursão pelo mercado editorial. Em 2011, ele sentiu a necessidade de tirar outra pérola da cartola, “Straight Talk, No Chaser: How to Find and Keep a Man” (“conversa franca, sem perseguidor: como encontrar e manter um homem”).
Essa guerra dos sexos não escapa ao olhar arguto de Story, que deslinda as competições intersexuais com tanta calma que “Pense como Eles” acaba se tornando um capítulo de novela alongado — o que, em si, não configura problema algum. O duro é ter de aceitar que os conselhos de Harvey ganham mesmo aura de verdade imexível, quando na verdadeira literatura sobejam modelos do que fazer ou não para conquistar alguém. Ler “Act like a Lady, Think like a Man” e seus filhotes decerto não está na primeira lista.
Filme: Pense como Eles
Direção: Tim Story
Ano: 2012
Gêneros: Romance/Comédia
Nota: 7/10