O melhor filme da Netflix (e talvez você ainda não o tenha assistido) Gianni Fiorito / Netflix

O melhor filme da Netflix (e talvez você ainda não o tenha assistido)

Histórias de amadurecimento frequentemente servem de reflexos das nossas vivências. Federico Fellini (1920-1993) dominava esse nicho no cinema, uma tradição do cinema europeu rica em detalhes e sentimentos. E é impossível não perceber a sombra imponente de Fellini quando nos deparamos com “A Mão de Deus” (2021), dirigido por Paolo Sorrentino. Ambos os cineastas, separados pelo tempo, mas unidos pela paixão pela arte, exaltam suas raízes e famílias italianas, transmitindo ao público uma viagem sensorial e introspectiva pelo interior da alma italiana.

Fellini, com seu toque característico, trouxe para as telas uma fusão de realidade e fantasia. Em “Amarcord” (1973), ele não apenas retrata a Rimini de sua juventude, mas também a imortaliza. Titta, o protagonista, é a personificação da juventude, repleta de curiosidade, desafios e um toque de rebeldia. Mesmo diante das ameaças do fascismo, ele se move com uma inocência que desafia o mundo ao seu redor. Este filme, que foi agraciado com um Oscar em 1975, é uma tapeçaria de memórias que combina a visão artística de Fellini com a genialidade de colaboradores como Giuseppe Rottuno na fotografia e a trilha sonora icônica de Nino Rota.

Sorrentino, por outro lado, imprime sua marca contemporânea na narrativa cinematográfica italiana. Em “A Mão de Deus”, ele não apenas presta homenagem aos mestres do passado, mas também contribui com sua própria perspectiva, moldada por décadas de mudanças sociais e culturais. A Nápoles de 1986, pintada por Sorrentino, é um mosaico de cores, sons e emoções. Fabietto Schiesi, o jovem protagonista interpretado de forma sublime por Filippo Scotti, se torna nossa janela para esse mundo. Através de seus olhos, nos aventuramos pelas ruas estreitas, sentimos o calor do sol mediterrâneo e mergulhamos nas complexidades da cultura italiana.

Os detalhes minuciosos, desde a configuração dos sets até a construção dos personagens, enriquecem cada cena. Sorrentino, mantendo-se fiel à tradição de contar histórias pessoais e autênticas, oferece uma visão interna de sua juventude. As interações de Fabietto, especialmente com figuras como o cineasta Antonio Capuano, são testemunhos de momentos que moldam a vida.

Ao explorar os desafios da carreira artística, Sorrentino nos apresenta a uma variedade de personagens, cada um carregando suas próprias histórias, aspirações e desilusões. E enquanto a obra faz uma breve menção ao famoso gol de Maradona em 1986, evita se prender em polêmicas, focando no essencial.

A narrativa entre Fabietto e seus pais é emotiva, um lembrete da fragilidade da existência humana e dos laços que nos unem. E, no coração dessa trama, Sorrentino articula uma declaração de amor ao cinema e à vida. Se ele almeja um lugar ao lado dos grandes como Fellini, “A Mão de Deus” demonstra que ele está mais do que equipado para tal jornada.


Filme: A Mão de Deus
Direção: Paolo Sorrentino
Ano: 2021
Gêneros: Drama/Comédia
Nota: 10/10