A mente humana tem seus mistérios, tantos e de tal modo absorventes que o homem precisa estar sempre alerta para não ser vítima dos delírios que ele mesmo fomenta. Matt Angel e Suzanne Coote dão vida a um filme algo hermético, que aparentemente trata de assuntos íntimos demais, mas à medida que o enredo de “Hypnotic” toma forma, o público descobre em si os elementos que ligam-no ao drama de uma personagem assolada por perdas, e que esmorece ainda mais quando se depara com falsos salvadores.
Esse lado da natureza de todos nós, tão cheio de reentrâncias e saliências, subidas e declives, luzes e sombras, fica a salvo da curiosidade quase sempre destrutiva de quem nos rodeia. Entretanto, há ocasiões em que as barreiras se estreitam a tal ponto que nos imaginamos vivendo numa espécie de universo paralelo, onde não somos mais os protagonistas da nossa própria vida, momento em que cresce a sensação de que algo de muito errado se anuncia, ganha proporções cada vez menos lógicas, cobre-se de uma aura de emoções que se libertam e se encastelam sem controle, até finalmente degringolar em frustração, melancolia, tristeza, paranoia.
Tudo é como um sonho, ou um pesadelo, em que lembranças as mais sombriamente monstruosas fundem-se ao pouco que conseguimos identificar com a realidade, tesouro ainda mais inestimável diante de aleivosias de toda ordem.
Uns mais do que outros, estamos todos vulneráveis às armadilhas que nos prepara nossa própria imaginação para tolher-nos a capacidade de apreender o que se passa a nossa volta. Sem saber como nos blindar das inócuas preocupações que terminam por virar-se contra nós, processo gradual e também impetuoso de que não raro afloram as emoções que nos nutrem e nos envenenam, da vida resta pouco mais que a sensação de perene tormento a acossar uma carne afadigada e um espírito em ruínas. Jenn, a mocinha interpretada com vivaz sensibilidade e uma doçura funesta por Kate Siegel, é essa mulher cada vez mais desnorteada pelo turbilhão de medonhas experiências que passaram a se lhe abater. Não tem mais emprego; ainda ama Brian, o namorado vivido por Jaime M. Callica, e ganha dele a devida atenção, mas pondera que é melhor para os dois que cada qual siga seu próprio rumo; e constata com uma precisão cada vez mais incômoda que ela e seus amigos estão em numa quadra da vida em que se só veem de quando em quando, para falar de seus próprios assuntos, sem mais nada que os conecte.
Siegel vai se firmando como uma das grandes musas do terror mais refinado. O encontro de Jenn com o parapsicólogo Collin Meade — atuação hipnótica de Jason O’Mara, com a licença do trocadilho — é o trampolim de onde Angel e Coote se jogam, a partir do bom roteiro de Richard D’Ovidio, para deliberar sobre fenômenos inexplicáveis, que, claro, têm um sentido bastante óbvio. Precisamente como sói acontecer na vida como ela é.
Filme: Hypnotic
Direção: Matt Angel e Suzanne Coote
Ano: 2021
Gêneros: Thriller/Terror psicológico
Nota: 8/10