Precisa de algo para acalmar a alma e deixar a semana mais leve? Este filme adorável e doce na Netflix é o remédio Divulgação / Roadside Attractions

Precisa de algo para acalmar a alma e deixar a semana mais leve? Este filme adorável e doce na Netflix é o remédio

O estranhamento de todas as coisas que define a adolescência, o desconforto frente ao mundo e a si mesmo, a vontade de transformar tudo quanto já existe, sem muita ideia de por onde começar e, o principal, de que jeito, costumam não acabar bem. A personalidade ainda por se consolidar de garotos como Adam Petrazelli, o protagonista de “Palavras nas Paredes do Banheiro”, aliada ao ímpeto a toda prova, força física em pleno vigor e a propensão natural da idade quanto a submeter a si e aos que estão ao seu redor a testes de bravura não raro degringolam em isolamento social, afrontação às leis, crime e, por fim, a tragédia do confinamento compulsório em instituições mantidas pelo Estado, que nem sempre contam com o básico para atendê-los e, dessa forma, colocar em prática o princípio básico de reeducar esses indivíduos e permitir que tornem ao convívio junto aos demais cidadãos. Thor Freudenthal parece querer instigar na audiência uma vontade malcontida de ajudar o personagem central de seu filme, que equilibra-se a custo entre a normalidade padrão que cerca todos os que o cercam, resistindo o quanto pode a uma doença mental grave, pronta para dar o bote. Pelo texto de Nick Naveda, livre adaptação do folheteen de Julia Walton, a recuperação de uma vida que se fragmenta antes mesmo que possa se fazer notar por suas tantas habilidades é um processo moroso, que depende dele, por óbvio, mas também do envolvimento e do compromisso de outras pessoas — além de boa dose de paixão. É aí que a história começa a ficar estimulante de verdade.

A sucessão de percalços que a vida esconde faz com que ter um glaucoma seja a melhor das surpresas indesejáveis. Lamentavelmente, não era uma doença oftalmológica o que causava em Adam as perturbações visuais que

o levam a conversar com as meninas bonitas e os brutamontes que só ele é capaz de ver. Charlie Plummer dá as mãos ao público, com quem atravessa toda a longa e doída jornada de autoconhecimento de seu bravo anti-herói, e ao seu lado descobrimos quais as verdadeiras chances de Adam quanto a sair do purgatório de um mal ainda por desvendar e ir para um outro estágio, que pode não ser o paraíso que ele imagina. Ele descobre-se um excelente cozinheiro, e transitar por entre facas, cutelos e outros materiais de inegável potencial destrutivo é o que, por paradoxal que soe, permite que torne-se quem é de fato. Somente na cozinha todas as vozes que atormentam-no, dirigindo-se a ele como se estivessem todos no mesmo plano, admitem sua inanidade e as coisas têm paz, afinal, voltando a sua dimensão própria. Freudenthal liga um e outro ponto que Naveda lhe sugere, alcançando, evidentemente, a convivência de Adam com a mãe, Beth, de Molly Parker, que empenha-se o quanto consegue pelo bem-estar do filho, mas precisa lidar com as questões da vida prática e, por que não?, com seus próprios sentimentos. O namoro com Paul, de Walton Goggins, se constitui em mais uma razão para que Adam passe cada vez menos tempo em casa, e não chega a ser exatamente um infortúnio que se envolva num acidente no laboratório de química do colégio, depois do primeiro surto psicótico, com consequências graves para um colega.

As inconfidências nas paredes e portas do banheiro masculino, também frequentado por uma garota, é princípio da virada para Adam. Maya, o gênio precoce da matemática interpretada com graça e rigor por Taylor Russell, domina o filme até o encerramento, e só ela poderia mesmo evitar a desdita tácita que rondava o personagem de Plummer. Histórias de amor de mocinhos ainda inocentes sempre terminam bem.


Filme: Palavras nas Paredes do Banheiro
Direção: Thor Freudenthal
Ano: 2020
Gêneros: Romance/Drama
Nota: 8/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.