O cineasta britânico Steve McQueen é conhecido por entregar diversos dramas contemplativos, que exploram os sofrimentos, fraquezas e vícios humanos em suas escalas mais expressivas, sob um olhar de deslumbre, de compreensão ou reflexão das irracionalidades e racionalidades que conduzem o homem a ser o que é. Uma greve de fome levada ao extremo em “Hunger”, fez Michael Fassbender, que interpretou o protagonista Bobby Sands, um membro do IRA, o Exército Republicano Irlandês, perder mais de 18 quilos. Em “Shame”, também Fassbender fez o papel de um viciado em sexo, alguém que chegou ao limite de sua sanidade mental e de suas relações com outras pessoas. Em “12 Anos de Escravidão”, McQueen adapta para as telas a insana e cruel biografia de Solomon Northup, um homem que viveu o máximo do sofrimento humano como escravo no século 19, na América. Na trilogia “Small Axe”, ele explora as diversas formas de racismo estrutural dos Estados Unidos. Já em “As Viúvas”, McQueen toma outro rumo, muda o ritmo e traz um suspense policial protagonizado por mulheres.
O estilo de “As Viúvas” parece, com certeza, surpreendente para quem acompanha a cinematografia de McQueen. Conforme a trama se desenrola, a produção parece se tratar de mais uma produção hollywoodiana com um orçamento gordo, cenas explosivas e um elenco altamente gabaritado. Os rostos que vão surgindo na tela são realmente chocantes. Viola Davis, Liam Neeson, Michelle Rodriguez, Jon Bernthal, Colin Farrell, Robert Duvall, Daniel Kaluuya, Brian Tyree Henry. Se você não perdeu o fôlego lendo os nomes até aqui, não tem assistido filmes suficientes nos últimos 30 anos.
No enredo, Veronica (Davis) é esposa do criminoso Harry (Neeson), que morre em uma explosão durante um assalto com seus comparsas. A única herança deixada por eles para suas esposas é uma dívida milionária com um mafioso, chamado Manning (Tyree Henry), a quem eles teriam roubado. Quando Veronica encontra no meio das coisas de Harry um plano para um próximo crime que ele cometeria, ela decide convocar as outras viúvas, Linda (Rodriguez) e Alice (Elizabeth Debicki), para praticar o assalto, pagar a dívida e ainda terem algo para se manter. No meio de tudo isso, há uma intricada trama cheia de reviravoltas, que inclui um político corrupto (Farrel) e uma disputa eleitoral.
Conforme o enredo se desenrola, percebemos que a história é mais inteligente do que inicialmente se apresenta. E nem tanto prioriza o racismo, já que os próprios líderes da comunidade negra estão também envolvidos no crime e exercem igualmente opressão sobre essas mulheres. O foco aqui é na resposta das viúvas que, abandonadas à própria sorte, tentam sobreviver e lutar contra a opressão na qual são submetidas. Então, McQueen dá palco para a resistência feminina em um mundo onde os opressores são todos os homens, inclusive os mortos, que deixam suas mulheres e famílias completamente desamparadas e inseguras.
Apesar das tantas estrelas, Viola Davis, quando aparece em cena, é sempre a que mais reluz. Sua atuação é o que dá musculatura e elegância para esta história, que poderia ser mais um enredo prosaico de Hollywood. Este filme também foi um dos últimos, mais precisamente o antepenúltimo filme de Robert Duvall, o eterno Tom Hagen, da trilogia de “O Poderoso Chefão”, mas que também coleciona outros papéis marcantes no cinema, como o de Killgore em “Apocalipse Now” e do apóstolo de “O Apóstolo”, dentre outros.
Um filme belamente orquestrado por McQueen e com atuações extraordinárias, “As Viúvas” contém cenas explícitas de violência e morte, mas pode ser um passatempo e tanto para adultos viciados em produções inteligentes de ação e suspense.
Filme: As Viúvas
Direção: Steve McQueen
Direção: 2018
Gênero: Suspense/Policial
Nota: 9/10