Um filme como nenhum outro. A obra-prima da Netflix que é um alento para a alma Regine de Lazzaris A. Greta / Netflix

Um filme como nenhum outro. A obra-prima da Netflix que é um alento para a alma

Aos 50 anos, Edoardo Ponti é filho da diva do cinema italiano, e ganhadora do Oscar de melhor atriz, Sofia Loren, e diretor com algumas poucas obras no currículo. Entre seus trabalhos, está “Rosa e Momo”, um doce e gentil melodrama sobre a amizade entre uma sobrevivente de Auschwitz e um órfão senegalês. Sua talentosa e célebre mãe interpreta Rosa, que divide cena com o pequeno, mas nem por isso menos incrível, Ibrahima Gueye, que vive Momo.

O menino passou por uma terrível tragédia na infância. Sua mãe foi assassinada pelo próprio companheiro e pai de Momo. Os cuidados sobre ele foram delegados pelo Estado ao doutor Coen (Renato Carpentieri), um carismático médico que atende diariamente dezenas de pessoas em uma clínica improvisada em sua casa. Uma de suas pacientes, Rosa, é furtada por Momo, que é obrigado pelo tutor a devolver o objeto e pedir desculpas pelo malfeito.

Rosa é uma idosa que acolhe filhos de mulheres que os abandonam ou não podem cuidar deles temporariamente. Responsável interina por Iosif (Iosif Diego Pirvu) e Babu (Simone Surico), ela fica resistente quando doutor Coen a pede para tomar conta, também, de Momo. Até porque o menino é um malandro. Furta pessoas, trafica drogas e é malcriado. Apesar das negativas, ela acaba cedendo e aceita a criança.

À princípio, a relação entre eles é meio conturbada. Momo é rebelde e Rosa não entende bem seu comportamento. O pune colocando-o para dormir em uma despensa lotada de parafernálias e o trata como um marginal. Rosa teme que Momo corte seu pescoço ou cometa alguma atrocidade com as outras crianças, mas apesar de seu comportamento errático, o menino também está apavorado e precisa de amor. Quando ele começa a trabalhar com Hamil (Babak Karimi), o paciente dono de uma venda, começa a aprender importantes lições de vida.

Um dia, Rosa e Momo avistam algumas famílias de refugiados sendo levadas pela polícia. O episódio faz com que ela trace um ponto de conexão entre sua história e a do menino. Assim como ele e milhares de outros estrangeiros abrigados na Itália, Rosa também já foi vítima da intolerância, considerada uma pária para o Estado, teve sua família perseguida e foi presa. Momo não entende o número tatuado em seu braço e não sabe o que é Auschwitz. Rosa acredita que é melhor que ele não saiba mesmo. Mas os gatilhos começam a mexer com a cabeça da mulher, que passa a ter apagões mentais e a ver sua saúde física se deteriorar.

Neste drama, temos dois personagens de personalidades fortes, cabeças duras e teimosos. Apesar dos atritos, eles encontram um território comum em seus passados sofridos. E é por causa de seus traumas que eles conseguem encontrar passagem para dentro um do outro. Enquanto essa amizade se desenvolve, os espectadores conseguem sentir a organicidade das atuações de Loren e Gueye. Loren é abrasiva, potente, avassaladora e sua presença toma conta da tela inteira. Quando Gueye aparece, é como se nosso coração se derretesse, porque há uma verdade muito nua e crua em seus gestos e expressões. A raiva explode de forma tão natural quanto as dolorosas lágrimas despencam de seus olhinhos cativantes. É impossível não se sentir comovido por ambas as atuações.

Para completar, também há as brilhantes participações de Babak Karimi e de Abril Zamora, que interpreta Lola, vizinha e amiga de Rosa. Uma mulher trans que oferece à protagonista uma amizade tão carinhosa, singela e verdadeira. Ambos os artistas completam o espetacular elenco desse belo filme italiano.

Com um pano de fundo sociopolítico, o drama aborda a corrupção da infância, a incompreensão dos adultos com a falta de maturidade do sistema nervoso das crianças, que constantemente agem por seus impulsos, não por malcriação. Também dá lições de tolerância e amizade e nos mostra que, às vezes, quem menos esperamos é quem pode nos salvar nos momentos mais desesperadores. Aqui, Rosa pode até ter sido abrigo para Momo, mas é ele quem a salva.


Filme: Rosa e Momo
Direção: Edoardo Ponti
Ano: 2020
Gênero: Drama
Nota: 9/10