O filme na Netflix que todas as pessoas deveriam assistir para acreditar em milagres e acalmar o coração

O filme na Netflix que todas as pessoas deveriam assistir para acreditar em milagres e acalmar o coração

O destino nos prepara surpresas, e muitas dessas surpresas se traduzem por fracassos retumbantes, que por seu turno escondem grandes oportunidades quanto a descobrir novos caminhos para se alcançar resultados com que se sonha há muito — desde que não se tenha medo de briga. Todos nos deparamos com obstáculos aparentemente invencíveis ao longo da vida, mas escalar essas muralhas não é para qualquer um. Até que se conclua que possíveis sacrifícios valem a pena, padecemos dos males que só nós mesmos conseguimos sentir, anunciados por aqueles instantes tão singulares de dúvida, de angústia, de solidão em que cada homem sobre a face do planeta torna-se mais senhor de si, mais conhecedor de seu espírito e da força infinita que nele existe. Conservar a própria a essência ao passo que se busca as condições necessárias para a mudança desejável é um dos grandes mistérios do viver, e por essa razão mesma, atingir essa meta é muitas vezes o maior feito de um homem.

O sonho — e a necessidade — de se reinventar, de tomar a própria vida nas mãos e transformá-la é tudo quanto se precisa nas quadras da existência em que só o que se queria era se ter a chance de exercer o sagrado direito de conquistar o pão que alimenta o corpo e a paz que sossega a alma sem interferências de qualquer natureza, como se viver fosse algo simples e tão pleno de vigor como um jogo. Em “Brian Banks: Um Sonho Interrompido” (2019), o diretor Tom Shadyac remete à história de um astro do futebol americano caído em desgraça, mas que não se conforma com a ruína e vai à luta, até torcer o placar a seu favor. Não é exatamente fácil, mas é só que se tem a fazer nesses momentos em que tudo o que julgávamos nosso por direito parece cada vez mais longe, e por razões que, de tão absurdas, fogem à compreensão de qualquer um que preze a verdadeira justiça — até porque a própria justiça se mostra um misto de enganos e contradições, uma combinação sempre muito perigosa quando se refere a indivíduos que não despertam o interesse da maioria.

Doug Atchison baseia seu roteiro na vida de Brian Banks, o ex-jogador da NFL, a liga nacional de futebol americano profissional dos Estados Unidos, falsamente acusado de estupro quando ainda era um astro que despontava no esporte. Mal assessorado, Banks acabou enfrentando um julgamento que o trucidou, amargou seis anos na cadeia, e desde então teve de se acostumar a ver seu nome associado a escândalos de cunho sexual sempre que algum outro episódio do gênero espocava na imprensa. Claro que em tempos de empoderamento feminino a menor referência a um homem minimamente suspeito de um crime tão hediondo já é o bastante para sugestionar plateias as mais heterogêneas, mas há que se ter calma aqui. Shadyac emprega o argumento de Atchison de modo a deixar claro que, por mais que o atleta reunisse todos indícios quanto a se cristalizar em torno de sua figura uma culpa natural, dessa vez tudo cheirava a uma armação grosseira, cujo real motivo apontava para uma situação ainda mais vexatória — e não para ele.

Linebacker em ascensão na prestigiosa Polytechnic High School em Long Beach, Califórnia, Banks, vividamente interpretado por Aldis Hodge, vê seu mundo cair ao dispensar uma garota que o seduzira. Ele e a moça — cujo nome fora mantido em sigilo e na história é chamada de Kennisha Rice, papel de Xosha Roquemore — haviam se dirigido para os fundos do corredor de uma das alas mais afastadas da universidade, mas ao longo do caminho todas as salas estavam cheias, e muitas com as portas as escâncaras: ou seja, teria sido impossível um ataque como o alegado pela suposta vítima. A grande ironia que o diretor faz questão de frisar é que o personagem-título, um homem bonito e com fama de conquistador, lança-se para a maior inferno de sua vida precisamente por ousar romper com os estereótipos que decerto o estigmatizavam à boca miúda. Tivesse ido em frente, a garota teria se satisfeito, possivelmente o esqueceria em pouco mais de uma semana e a vida seguiria seu curso.

A partir do segundo ato, Banks conta com a orientação do advogado Justin Brooks, de Greg Kinnear, e desperta o perturbado interesse da personal trainer Karina Cooper, que o ajuda a recuperar a forma. Melanie Liburd é uma grata surpresa ao ter a sensibilidade de mostrar o encanto de sua personagem por um homem a quem teria de abominar, devido a um trauma desse universo, mas por quem se apaixona e, acertadamente, defende sem medo.


Filme: Brian Banks: Um Sonho Interrompido
Direção: Tom Shadyac
Ano: 2019
Gêneros: Drama/Biografia
Nota: 8/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.