A história começa com um ataque que atinge um pequeno grupo de militares e obriga um sobrevivente a sair do protocolo. Em “Sem Remorso”, Michael B. Jordan interpreta John Kelly, com Jodie Turner-Smith e Jamie Bell cercando uma cadeia de comando que evita luz direta, sob a direção de Stefano Sollima. O conflito central se impõe cedo: ao tentar identificar quem escolheu sua equipe como alvo, Kelly encosta numa operação oficial que prefere um culpado manejável a uma verdade difícil.
A primeira decisão de Kelly é agir antes que a instituição feche o caso. Ele monta uma lista de suspeitos com nomes incompletos, endereços e horários recolhidos a toque de caixa. A motivação é direta: impedir que os responsáveis desapareçam na burocracia. O obstáculo aparece em forma de hierarquia e vigilância; cada consulta pede autorização, e a autorização vem com gente monitorando seus passos. O efeito é aumentar o risco pessoal dele, porque a própria investigação passa a tratá-lo como problema a ser contido.
Do luto ao gabinete: a versão oficial em construção
Em paralelo, a cúpula decide transformar o ataque em argumento para ação externa. Reuniões curtas definem alvos, escolhem palavras, constroem uma rota de resposta. A motivação é retomar controle do calendário e do noticiário. O obstáculo é sustentar a acusação sem expor fontes nem admitir dúvida. Para Kelly, a oferta é tentadora: recursos e acesso em troca de participação numa missão fora do país. O efeito é colocá-lo dentro de um plano que promete transparência e funciona por omissões.
Quando ele aceita, aceita como quem compra passagem para chegar a um endereço. A promessa é simples: inteligência, cobertura, chance de cruzar nomes. O preço é obedecer etapas e tolerar lacunas, ou melhor, aceitar que alguém sempre guarda uma parte do mapa para decidir depois o que será dito. O obstáculo passa a ser a forma de execução: a missão depende de confiança mínima entre gente que se conheceu no calor do caso, e qualquer iniciativa individual pode comprometer a fachada institucional. A consequência é uma tensão constante entre o que ele quer saber e o que a operação permite perguntar.
Sollima restringe informação e troca de observador
Sollima filma a preparação e a execução como rotina de procedimentos, não como exibição de heroísmo. Checagens, deslocamentos, entradas e saídas em bases, salas e corredores. O diretor escolhe entregar a informação em pedaços, como se a câmera também fosse submetida a sigilo. A motivação dessa escolha é manter o espectador preso ao mesmo limite de conhecimento do protagonista. O obstáculo é que a pressa torna erros mais prováveis, e o efeito é fazer cada decisão parecer definitiva mesmo quando falta certeza completa.
A narrativa alterna observadores para mostrar como versões são produzidas. Em alguns trechos, segue Kelly de perto, registrando a violência como ferramenta de busca. Em outros, acompanha oficiais e agentes que falam baixo e preferem relatórios a rostos. Essa troca muda o que parece confiável, porque cada núcleo enxerga só o necessário para executar sua parte. O obstáculo é a assimetria de informação. O efeito é transformar qualquer pista em disputa: para um grupo, prova; para outro, inconveniência que precisa ser escondida.
Vigilância interna, correções de rota e custo político
Entra aí a personagem de Turner-Smith, que decide vigiar Kelly sem expulsá-lo da operação. A motivação dela é manter o plano de pé e impedir que o impulso individual derrube a missão inteira. O obstáculo é lidar com alguém que lê evasivas como ameaça e silêncio como armadilha. O filme traduz esse atrito em logística: rotas trocadas, acesso negado, presença vigiada, portas fechadas antes da conversa terminar. Cada restrição reduz a margem de improviso, e improviso é o que Kelly usa para continuar avançando.
O procedimento ganha velocidade quando o plano começa a exigir correções no meio do caminho. Uma identificação vem errada. Uma confiança se prova prematura. Um contato some. A motivação das correções deixa de ser capturar alguém e passa a ser salvar a operação de um colapso público. O obstáculo é que cada ajuste deixa rastros. O efeito é ampliar o alcance político do caso, porque o erro vira munição para decisões mais duras.
Em uma etapa adiante, o plano precisa seguir mesmo quando a lealdade interna já não é garantida. Kelly decide insistir em perguntas que o cronograma não comporta, e isso obriga superiores a reagirem para manter a missão coesa e a versão intacta. A motivação dele é evitar virar peça descartável; o obstáculo é que aliados têm metas próprias e capacidade real de contê-lo. A sequência se organiza como disputa por controle de espaço, com corredores, portas trancadas e mensagens que chegam tarde.
Depois, as consequências se impõem sem alívio. Uma promessa de proteção perde valor, e a cadeia de comando mostra que pode negar o que disse com a mesma naturalidade com que autorizou o que precisava ser negado mais tarde. Kelly reage tentando reduzir as opções do jogo, mas o obstáculo final é um aparelho que sabe investigar, arquivar e encerrar assuntos. O filme o deixa atravessando outro corredor, documento dobrado no bolso e rádio chiando, enquanto a próxima sala permanece fechada.
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