Romance húngaro no Prime Video mostra que o amor chega quando se menos espera Divulgação / Film Positive Productions

Romance húngaro no Prime Video mostra que o amor chega quando se menos espera

O interesse inicial por “O Pretendente“ costuma nascer da simplicidade aparente de sua premissa: um acordo conjugal limitado por prazo, costurado para satisfazer conveniências familiares e financeiras. No entanto, a narrativa conduzida por Ida, interpretada com contenção calculada por Dorka Gryllus, amplia essa moldura. A jovem retorna ao mundo exterior após anos no convento e percebe que a única estrutura que reconhecia como estável, o pai interpretado por Attila Tóth, se desfez em meio a excessos, festas improvisadas e uma noiva cuja idade confronta diretamente qualquer noção razoável de responsabilidade. O roteiro desloca Ida de um ambiente de disciplina forçada para outro tipo de tutela: a necessidade de encontrar um destino social aceitável para não se tornar um incômodo.

A decisão do pai de publicar um anúncio oferecendo a filha em casamento, apesar do desconforto ético evidente, evidencia o pragmatismo do período retratado. O casamento arranjado com Csaba, vivido por Gergely Kaszás, funciona como solução administrativa. Ele necessita de dinheiro; ela precisa de uma saída. O acordo é simples: um ano de convivência respeitosa e, depois, o divórcio, que permitiria a Ida viver sozinha, privilégio inacessível para uma mulher solteira que jamais tivesse passado por um matrimônio. Essa lógica, absurda aos olhos contemporâneos, é tratada com naturalidade pelo filme, e o efeito dramático nasce justamente dessa fricção entre restrições sociais rígidas e estratégias individuais de sobrevivência.

A convivência entre Ida e Csaba é construída sem pressa, com pequenos confrontos e ajustes que revelam dois personagens tentando evitar qualquer vínculo emocional profundo. O comportamento reservado dele e a ingenuidade dela, fruto não de tolice, mas de um isolamento contínuo, criam um campo de tensão moderado, no qual cada gesto carrega implicações morais e sociais maiores do que aparenta. Os momentos de humor, quase sempre conduzidos pela empregada Kati, interpretada com ótimo timing por Enikö Börcsök, funcionam como pausas necessárias num ambiente regido por códigos antiquados que pesam sobre todos.

O filme aposta em detalhes para demonstrar o distanciamento entre as intenções declaradas e os sentimentos que começam a surgir. A sequência do falso relato sobre o primeiro encontro, criada para impressionar amigos de Csaba, expõe um contraste interessante: Ida imagina um cenário romântico, enquanto ele rebate com pragmatismo, afirmando que um pintor jamais dedicaria a vida inteira à mesma imagem. Mais adiante, quando Ida visita o ateliê e se depara com uma coleção de retratos seus, a narrativa evidencia a evolução afetiva silenciosa que o casal vinha tentando negar. A previsibilidade do acontecimento não o enfraquece; ao contrário, reforça o caráter moralmente contido da história, que não depende de surpresas, mas de coerência emocional.

A direção mantém sua atenção na rigidez das convenções sociais, sugerindo que, para Ida e Csaba, o afeto se torna uma consequência natural de uma convivência que ambos tentaram transformar em compromisso burocrático. A estrutura do enredo permite observar como os personagens se ajustam às limitações impostas, contornam expectativas alheias e constroem espaços mínimos de liberdade dentro de regras que não escolheram. As atuações são discretas, o ritmo é constante e o filme aposta mais na observação do cotidiano do casal do que em conflitos explosivos.

O resultado trabalha com delicadeza, mas sem sentimentalismo excessivo. “O Pretendente“ desenha um percurso emocional direto, baseado em circunstâncias sociais restritivas e na tentativa de dois indivíduos de reorganizar suas vidas com dignidade. O interesse do filme está menos na surpresa e mais na clareza do processo: absorver os limites, testar o que é possível dentro deles e descobrir que, mesmo em acordos nascidos de conveniência, certos vínculos acabam se impondo com a naturalidade de algo que simplesmente se construiu no silêncio.

Filme: O Pretendente
Diretor: Krisztina Goda
Ano: 2022
Gênero: Drama/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Fernando Machado

Fernando Machado é jornalista e cinéfilo, com atuação voltada para conteúdo otimizado, Google Discover, SEO técnico e performance editorial. Na Cantuária Sites, integra a frente de projetos que cruzam linguagem de alta qualidade com alcance orgânico real.