Um escritor atribui a si a obra de outro homem e, ao colher aplausos, descobre que todo sucesso tem testemunhas. Em “As Palavras”, dirigido por Brian Klugman e Lee Sternthal e estrelado por Bradley Cooper, Zoe Saldana, Jeremy Irons, Dennis Quaid e Olivia Wilde, o conflito central coloca prestígio contra verdade. A trama acompanha um autor badalado que lê, diante de uma plateia, o livro que o consagrou, enquanto sua narrativa encena a carreira de um jovem que comete plágio e enfrenta as consequências. O filme propõe que cada decisão para avançar na literatura altera o risco de queda, o tempo da culpa e a escala do dano.
Clay Hammond, interpretado por Dennis Quaid, abre a narrativa como escritor reconhecido que apresenta seu novo livro a leitores atentos. Durante a leitura, ele descreve Rory Jansen, vivido por Bradley Cooper, um aspirante a romancista que deseja ser publicado, sustentar a casa e provar valor a si mesmo e ao mercado. O objetivo do personagem é simples e direto: transformar dedicação em um primeiro romance de impacto. O obstáculo inicial é duro e cotidiano. Editor após editor recusa seus manuscritos. O emprego fixo em uma editora paga as contas, mas consome horas e energia. A vida ao lado de Dora, interpretada por Zoe Saldana, oferece afeto e encorajamento, porém não resolve o impasse entre sonho e realidade.
A virada acontece quando Rory encontra, dentro de uma pasta antiga comprada em um brechó, um manuscrito imaculado. Ele digita o texto no próprio computador, primeiro para sentir a música daquela prosa nos dedos, depois para mostrar à esposa “algo novo”. Dora lê, se emociona e, certa da qualidade, empurra o marido a seguir adiante. O encorajamento amoroso muda o tempo dramático. O que era protelação vira prazo. Quando um editor lê aquele texto e decide apostar, a carreira de Rory abre caminho. A assinatura na capa legitima o impostor e distribui o erro por contratos, prêmios e entrevistas. A repercussão pública legitima a mentira e amplia o risco de exposição.
A prova chega por um velho desconhecido que se aproxima de Rory em um parque. Jeremy Irons interpreta esse homem com memória afiada e dor guardada. Ele conta sua própria história, a de um jovem soldado que, após a guerra, se apaixona em Paris, escreve seu grande romance, perde o manuscrito por acidente e não consegue reescrevê-lo com a mesma vida. O relato revela a origem do livro e muda o objetivo de Rory. De manter a farsa sem alarde, ele passa a conter o dano, negociar silêncio ou reparar o que for possível. O risco sobe porque há alguém específico, vivo e lúcido, que pode desautorizar o sucesso dele com uma frase.
Dora ocupa papel decisivo nas consequências. Ao perceber a dimensão do erro, a personagem precisa escolher entre proteger o marido ou rejeitar a fraude que tornou pública a vida do casal. Suas reações redefinem o foco das cenas em casa e modulam o tempo da culpa. Cada olhar de Dora, cada pergunta simples, adiciona peso ao dia de Rory e reordena prioridades. O casamento deixa de ser refúgio para se tornar espaço de cobrança silenciosa, o que pressiona o protagonista a agir rápido, e agir rápido costuma gerar novas falhas.
No plano externo, o mercado responde com eficiência. Agentes fecham novas edições, jornalistas pedem perfis, prêmios chegam. O chefe de Rory, vivido por J. K. Simmons, reconhece o brilho do título e ajusta funções. Essas decisões aumentam a altura da queda em caso de exposição. O filme permite acompanhar a matemática da mentira: quanto mais a obra vende, mais pessoas dependem dela e mais caro fica dizer a verdade. O dinheiro de adiantamentos e a agenda cheia criam uma segunda prisão, de compromissos e rostos interessados.
O romance dentro da história, interpretado por Ben Barnes e Nora Arnezeder nos papéis do jovem escritor e de sua esposa francesa, funciona como espelho do que Rory perde quando escolhe o atalho. A sequência parisiense mostra trabalho, paixão e perda. Quando o manuscrito some e o autor falha ao recriar o próprio livro, a vida do casal muda de rumo. Anos depois, o texto aparece em outra cidade, em outra língua, com outro nome na capa. Esse caminho de ida e volta dá material à acusação do velho, não como vingança, mas como lembrança de que literatura carrega biografias. Ao ouvir a história completa, Rory mede a sua contra a do outro homem e precisa decidir a próxima frase a dizer.
Clay Hammond, de volta à moldura da leitura pública, lida com perguntas de Daniella, personagem de Olivia Wilde, uma admiradora atenta. As conversas entre os dois alteram informações que o público tem sobre a relação entre escritor, livro e culpa. Quem escreveu o quê, quem assumiu riscos, quem transferiu responsabilidades. A cada resposta evasiva, o auditório dentro do filme percebe lacunas, e o auditório de fora entende o movimento dos autores ao amarrar camadas narrativas. O efeito não é truque gratuito. Ele desloca o ponto de vista entre confissão privada e encenação pública e expõe como um espetáculo literário pode mascarar um crime ético.
O ponto máximo se dá quando Rory precisa decidir entre confessar e perder tudo o que ganhou, ou calar e consolidar uma carreira construída sobre alicerce errado. O velho apresenta a ele a conta emocional daquela página roubada, e Dora aponta a conta doméstica do mesmo ato. O protagonista tenta inventar um meio-termo que contente todos, mas percebe que a hesitação também é escolha, com custo próprio. O relógio dramático avança, contratos pedem respostas e rostos próximos pedem honestidade.
“As Palavras” sustenta a tensão apoiada em decisões verificáveis. Uma pasta antiga, um texto digitado, uma assinatura em contrato, um encontro no parque, uma leitura pública, uma pergunta que não se cala. O filme mostra como o aplauso pode abafar remorso por algum tempo, mas não torna o erro menos rastreável. Resta a possibilidade de ganho literário ao preço da própria voz, e a lembrança de que, na vida real, os créditos têm história.
★★★★★★★★★★


