Há algo deliciosamente subversivo em assistir um filme natalino que recusa a ingestão forçada de boas intenções como quem rejeita panetone com frutas cristalizadas. “Operação Natal” aposta justamente nisso: um espetáculo que embala a doçura típica da data com socos, ironias e criaturas que parecem ter fugido de folclores que o mundo ocidental só lembra quando quer parecer mais culto no Instagram. A premissa, Papai Noel sequestrado e uma missão frenética para recuperá-lo, poderia desabar na caricatura, mas encontra graça ao aceitar o seu próprio exagero como credo. Aqui, o Natal não é um território sagrado; é um parque temático onde mitologias se trombam sem pedir licença.
O filme se diverte ao pincelar referências de tradições nórdicas, alpinas e islandesas, como se dissesse ao espectador: “Você achou que conhecia o Natal? Senta que a renas vão descer quebrando tudo”. Em vez de apostar apenas no brilho dos enfeites, o universo criado parece disposto a mostrar que nem toda a fantasia dessa época pertence a cartões açucarados. Na narrativa, o imaginário coletivo é esticado até quase rasgar, questionando a fé pueril no “espírito natalino” enquanto entrega perseguições, piadas com cheiro de pólvora e duendes que definitivamente não foram treinados para embrulhar presentes.
A dupla protagonista sustenta essa travessia improvável com charme irregular, mas funcional. Não são heróis de manual; guardam ressentimentos, frustrações e a impressão persistente de que suas escolhas nunca estiveram à altura do que esperavam de si mesmos. E é justamente essa falha humana que torna sua jornada minimamente tocante. Eles não partem para salvar o símbolo máximo do Natal por altruísmo iluminado, mas por um misto de culpa, desejo de redenção e teimosia emocional. E quando vacilam, o que fazem com frequência, o filme encontra aí o seu melhor terreno: a comédia confeitada com falhas morais.
Ainda assim, não dá para ignorar algumas escorregadas. Certos elementos digitais parecem inacabados, como se o computador tivesse ido dormir antes de finalizar as texturas. Há criaturas cuja estética flerta perigosamente com o involuntariamente bizarro, arrancando risos onde deveria gerar temor. O humor, por sua vez, às vezes hesita entre a ironia afiada e o comentário mais óbvio. Mas mesmo quando erra, a experiência não degringola; apenas confirma que o filme prefere o ridículo à mediocridade comportada, o que, convenhamos, é uma decisão criativa de respeito.
“Operação Natal” sabe que jamais receberá a honra de “clássico obrigatório” exibido anualmente antes da ceia. Ele não quer carregar o peso de mensagem profunda, nem reinventar o cinema de ação. O intuito é mais simples e mais libertador: permitir que por duas horas as pessoas larguem a seriedade das metas de fim de ano e aceitem uma aventura absurda onde Papai Noel corre risco real e, ainda assim, tudo continua cheirando a chocolate quente. É como se o filme nos lembrasse que a magia do Natal também pode ser caótica, ruidosa e cheia de piadas de gosto duvidoso, e que talvez seja justamente aí que ela faça sentido.
A crítica especializada torceu o nariz, como se tivesse encontrado glitter na salada, imperdoável. Mas há uma verdade silenciosa: aqueles que entrarem na sessão dispostos a sorrir do próprio ceticismo podem sair genuinamente mais leves. O Natal, afinal, nunca foi sobre coerência narrativa. Foi sempre sobre acreditar, mesmo quando nada ao redor faz sentido. E se esse título celebra o absurdo com entusiasmo suficiente para nos arrancar uma gargalhada honesta, então já cumpriu uma função que muito drama “respeitável” invejaria.
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