Uma jovem nova-iorquina decide ser mãe por conta própria, planeja cada passo e, no meio do processo, se apaixona por um professor casado que promete abandonar o casamento e começar uma nova vida ao lado dela. A partir desse triângulo, “O Plano de Maggie” acompanha idas e vindas sentimentais, mudanças de estratégia e o atrito entre desejo e responsabilidade. Dirigido por Rebecca Miller, com Greta Gerwig, Ethan Hawke e Julianne Moore, o longa parte de uma história original de Karen Rinaldi e desloca a comédia romântica para um território de escolhas práticas que nem sempre combinam com discursos grandiosos sobre amor. O primeiro movimento é simples: a personagem quer cumprir um projeto íntimo; o segundo, imprevisível, coloca em cena um homem encantador e indeciso; o terceiro envolve a ex-mulher, acadêmica rígida e ferida, que também defende seu espaço.
“O Plano de Maggie” situa esse jogo afetivo no meio universitário de Nova York, com salas de aula, palestras e conversas em cafés onde o prestígio pesa tanto quanto a franqueza. Maggie, vivida por Greta Gerwig, trabalha, paga as contas e pensa em prazos. Ao se apaixonar por John, papel de Ethan Hawke, se vê responsável por apoiar o escritor em um livro que ele promete há anos, além de lidar com a casa, a filha dele e os próprios planos de maternidade. Do outro lado, Georgette, interpretada por Julianne Moore, é uma pesquisadora metódica, ciumenta do tempo e do talento do ex-marido. O filme observa como cada um defende seus objetivos enquanto tenta preservar algum afeto, e como a solução mais lógica pode criar novos impasses.
Maggie acredita que consegue administrar sentimentos com a mesma objetividade com que cuida das tarefas. O humor nasce quando previsões racionais esbarram no comportamento de pessoas reais. A protagonista não é santa nem vilã. Faz gentilezas, comete imprudências e segue adiante. Gerwig imprime fisicalidade leve, olhares laterais, hesitações e impulsos pequenos que indicam uma mente sempre calculando rotas possíveis. Em cena, a personagem não pede admiração; pede tempo para reavaliar. Há graça quando Maggie tenta conciliar o livro de John, as demandas de trabalho e a dinâmica com a filha dele, porque o acúmulo de funções revela o custo de sustentar um adulto que promete mais do que cumpre.
John funciona como o escritor charmoso e eternamente em rascunho. Ethan Hawke explora a fala terna, o sorriso rápido e a carência por leitoras e ouvintes. Declara-se progressista, mas prefere ser conduzido. Essa ambiguidade dá lastro às recaídas do personagem e explica por que Maggie alterna fascínio e cansaço. Julianne Moore, com humor seco, constrói Georgette como uma intelectual exigente que teme perder território. Seu acento marcado e a postura rígida a princípio parecem um verniz chamativo, mas cenas posteriores revelam fragilidade e orgulho ferido. Não se trata apenas de antagonismo: é uma mulher que investiu anos em um parceiro que a tratou como colaboradora e que agora precisa se recolocar como mãe e pesquisadora.
A direção de Rebecca Miller prefere observação a truques. A câmera acompanha conversas em corredores, encontros planejados que escorregam e reuniões acadêmicas onde disputas pessoais falam alto. As gags não dependem de escadas ou quedas; dependem de silêncios, interrupções e justificativas deslocadas. Quando Maggie propõe arranjos pouco usuais para resolver impasses, a comicidade se apoia na sensação de que todo mundo topa uma saída improvisada desde que não pareça derrota. Esse tom também evita punições exemplares. Ninguém recebe um carimbo definitivo, o que favorece a continuidade emocional das figuras retratadas.
Há passagens em que o filme explica mais do que precisa, como se temesse o mal-entendido. A segunda metade repete conversas e insiste em expor intenções que já estavam claras. Esse excesso de fala diminui a surpresa de algumas decisões e reduz a margem para que o público preencha lacunas. Ainda assim, quando Maggie percebe que a obsessão por planos cria novas confusões, a narrativa encontra fôlego em pequenos deslocamentos de humor. O que parecia uma história de conquista amorosa vira, aos poucos, um estudo sobre divisão de trabalho, responsabilidades parentais e projetos pessoais empurrados para depois.
O cenário intelectual não é apenas pano de fundo. A discussão sobre autoria, colaboração e reconhecimento aparece no cotidiano de forma muito concreta. John depende de leitoras próximas para validar parágrafos e, sem perceber, terceiriza tarefas domésticas e emocionais. Georgette mede a própria relevância em artigos e convites. Maggie tenta não ser engolida por nenhum dos dois mundos, mas descobre que limites precisam ser ditos para existirem. Quando as crianças entram em quadro, o filme amplia a dimensão do conflito. A comicidade diminui e cede espaço a conversas necessárias sobre tempo, cuidado e escolhas que não atendem a todos ao mesmo tempo.
Greta Gerwig mantém a personagem longe de estereótipos. Os gestos práticos convivem com lampejos de dúvida, e o riso nunca mascara a fadiga. Ethan Hawke não transforma John em caricatura; aceita sua mediocridade charmosa, o que torna crível a atração e o desgaste. Julianne Moore faz humor com a rigidez de Georgette sem retirar humanidade. Juntos, formam um triângulo que se reorganiza conforme obrigações e vaidades mudam de peso. Isso sustenta o interesse mesmo quando a trama repete caminhos já percorridos por histórias de separação e recomeço ambientadas em bairros cultos de Manhattan.
A música e a fotografia acompanham essa leveza cotidiana, sem truques de destaque. A luz favorece interiores aconchegantes, bibliotecas e apartamentos onde livros e brinquedos dividem prateleiras. O desenho de produção confia em objetos simples para indicar rotinas que se sobrepõem. Pequenas elipses marcam passagens de tempo e evitam dramatizações que roubariam a graça do filme. Nada pretende soar monumental, e é nessa contenção que se encontram as melhores notas da obra.
Em “O Plano de Maggie”, o interesse recai menos sobre a conquista e mais sobre a manutenção. Fala de pessoas adultas que confundem projeto com afeto e que, cedo ou tarde, precisam reconhecer limites. Quando a protagonista aceita que planos mudam e que improviso também é escolha, as relações ganham nova chance de acomodação. A última imagem sugere continuidade, não ponto final, porque as rotas do cuidado raramente cabem em um único mapa.
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