Ainda em cartaz nos cinemas e já na Netflix: o novo suspense de Kathryn Bigelow é a grande estreia de 2025 Divulgação / Netflix

Ainda em cartaz nos cinemas e já na Netflix: o novo suspense de Kathryn Bigelow é a grande estreia de 2025

Um míssil sem assinatura é detectado a caminho de território norte-americano, e menos de vinte minutos separam a informação de uma resposta oficial. Telefones tocam em sequência, protocolos são acionados, equipes militares e civis trabalham em paralelo para verificar dados, medir riscos e orientar a chefia do Executivo. Em “Casa de Dinamite”, a tensão nasce da escassez de tempo e da abundância de dúvidas, com cada minuto alterando o peso de uma decisão que atinge milhões.

Dirigido por Kathryn Bigelow, o filme reúne Idris Elba, Rebecca Ferguson e Gabriel Basso à frente do elenco, com Jared Harris, Tracy Letts, Anthony Ramos, Moses Ingram, Jonah Hauer-King, Greta Lee e Jason Clarke. Ferguson interpreta a Capitã Olivia Walker, oficial mais sênior na Sala de Situação da Casa Branca, responsável por coordenar o Watch Floor e o fluxo de informações; Elba vive o presidente que precisa decidir com base em relatórios incompletos. O roteiro é de Noah Oppenheim.

A narrativa se compõe como sequência de tarefas: detectar, confirmar, comunicar, deliberar. Em vez de apostar em destruição em larga escala, o filme acompanha mesas de crise, bases de defesa e salas de monitoramento, lugares onde estatísticas e mapas ganham valor dramático. O relógio dita o ritmo, e a história se concentra no que pode ser feito com os dados disponíveis, sem afetação oratória. Quando uma informação chega truncada, a cadeia de comando precisa decidir se aguarda a checagem ou se avança para a próxima etapa, ciente de que cada passagem de tempo altera o cenário.

O elenco sustenta esse desenho com interpretações que priorizam contenção. Idris Elba constrói um presidente atento a peso histórico e a pressões simultâneas, dividido entre prudência e a necessidade de emitir sinais claros para aliados e adversários. Rebecca Ferguson, como a oficial que coordena o fluxo de dados, mantém a narrativa ancorada no trabalho de filtrar barulho e priorizar o essencial. Gabriel Basso dá corpo à curva de aprendizagem de quem ascende no momento menos conveniente. Jared Harris e Tracy Letts representam correntes de pensamento divergentes na burocracia de alto nível, e suas discussões trazem substância às reuniões que precisam sair do impasse.

Do ponto de vista formal, a direção privilegia proximidade e legibilidade. A fotografia de Barry Ackroyd evita contrastes decorativos e trabalha com ambientes frios de operações e espaços pessoais que evidenciam cansaço. A edição de Kirk Baxter alterna momentos de fala com pausas que já são notícia, porque a ausência de novas leituras interfere diretamente na decisão. O desenho musical de Volker Bertelmann aparece de maneira parcimoniosa, acelerando pulso quando a informação muda de patamar e recuando quando o silêncio pesa mais do que um discurso.

Há mérito na forma como o filme encadeia perspectivas. Passagens entre a Sala de Situação, bases em alerta e órgãos de inteligência mantêm coerência espacial e lógica, permitindo ao público acompanhar causas e efeitos sem explicações redundantes. O procedimento ganha interesse quando setores com prioridades distintas colidem: defesa pede cautela, diplomacia busca tempo, política exige mensagem, comunicação calcula como traduzir incerteza. Dessa colisão saem decisões que não agradam a todos e, ainda assim, precisam ser assinadas em minutos.

O texto, porém, incorre em algumas facilidades. Certos diálogos explicam demais o que enquadramentos e interpretações já tornaram claro, e a repetição de justificativas enfraquece trechos que pedem concisão. Personagens coadjuvantes, em especial figuras técnicas fora do círculo principal, por vezes se aproximam de tipos funcionais, com frases pensadas para resumir dilemas amplos. Nada disso desmonta a tensão da proposta, mas compromete a densidade de partes que prometiam ambiguidade maior.

Outro acerto está na recusa a impor um antagonista carismático. A ameaça é definida pela falta de autoria confirmada e pelo risco de erro irreversível. Em lugar de um rosto que concentre maldade, o filme acompanha a incerteza como dado central. Essa escolha desloca o interesse para o processo de checagem e para o tema da responsabilidade, mantendo a discussão em âmbito verificável: quem pode decidir, com quais evidências e em qual prazo. Quando as leituras de trajetória e origem se contradizem, o público entende por que a hesitação pode salvar ou custar vidas, sem necessidade de sublinhados.

A câmera favorece planos que se fixam em rostos, telas e mapas. O visual não busca brilho gratuito, mas clareza: linhas de comunicação, registros de confirmação, assinaturas que liberam etapas. Cada detalhe banal — uma anotação apressada, uma marca de caneca sobre um briefing — contribui para o retrato de rotina que de repente precisa absorver o extraordinário. Com isso, o filme evita alegorias infladas e fica próximo de procedimentos reais, sem pretender selo documental.

Há ainda o acerto do recorte temporal. A história trabalha com uma janela curta que dificulta grandes arcos pessoais, e isso impede desvios melodramáticos. Quando surgem incursões na vida privada, funcionam como lembrança de que a autoridade pública não anula fadiga e medo. Essas passagens, usadas com cuidado, ajudam a manter a urgência como eixo, pois a volta à mesa de decisão acontece rápido e com impacto mensurável no próximo passo.

A produção passou por exibições internacionais em outubro, incluindo uma janela limitada em território britânico e norte-americano. Esse caminho reforça o interesse da plataforma em sustentar conversas simultâneas entre quem viu no cinema e quem acompanha em casa, ampliando o alcance de um tema que costuma ficar restrito a relatórios e comissões.

No saldo, o filme oferece tensão contínua, foco em consequências e discussão transparente sobre limites de decisão em cenários de alto risco. Falta maior nuance a figuras secundárias e sobra alguma explicação em trechos que dispensariam palavras, mas o retrato do poder diante da incerteza preserva vigor e clareza. O último plano não traz conforto: deixa no ar a pergunta sobre quais evidências serão suficientes na próxima vez que um alerta acender, hipótese que mantém o assunto vivo fora da sala escura.

Filme: Casa de Dinamite
Diretor: Kathryn Bigelow
Ano: 2025
Gênero: Drama/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★