Jennifer Lawrence estava cansada. Depois de Tiffany Maxwell, a louca mansa que deu-lhe o Oscar de Melhor Atriz por “O Lado Bom da Vida” (2012), de David O. Russell, Lawrence achou que era hora de relaxar — e fez bem. Curiosamente, ela já havia sido indicada à estatueta de melhor performance feminina por “Inverno da Alma” (2010), dirigido por Debra Granik, e continuou a ser lembrada pela Academia por “Trapaça” (2013), e “Joy: O Nome do Sucesso” (2015), ambos também de Russell, aquele num papel secundário. “Que Horas Eu Te Pego?” não serve de trampolim para novos galardões em favor de Lawrence, mas isso não é nenhuma tragédia. O filme do ucraniano-americano Gene Stupnitsky (e não de, bem, Russell) pede uma atuação despretensiosa, leve, coisa que a protagonista também faz sem esforço. Stupnitsky e o corroteirista John Phillips deambulam pela jornada pouco auspiciosa de Maddie Barker, uma motorista de carro por aplicativo e garçonete às portas da falência que parece ter encontrado seu pote de ouro no fim do arco-íris, mas acaba colhida por um logro.
Maddie serve mesas num bar na costa de Montauk, um vilarejo em Long Island, Nova York, na tentativa de ter os 22 mil dólares que precisa para quitar a hipoteca da casa, seu único patrimônio. Sua mãe morrera há pouco, e seguindo a trilha de infortúnios, seu carro também será levado devido às prestações inadimplentes. Numa seção de classificados online, ela fica sabendo que pode conseguir sua virada e tornar-se a dona de um Buick Regal de sessenta mil quilômetros rodados, desde que aceite namorar o filho de dezenove anos de um casal de ricaços. Percy para a Universidade de Princeton no outono, mas ainda não bebe, não costuma ir a festas — e continua virgem. Depois de traçar um perfil abrangente de Maddie, Stupnitsky fixa-se em Percy, e não é fácil dizer qual dos dois mais rouba a cena. Depois de uma temporada bem-sucedida na Broadway, Andrew Barth Feldman faz uma estreia promissora no cinema. Percy nunca suspeita das verdadeiras intenções de Maddie, uma mulher solteira de 32 anos que dirige-se ao abrigo de cães onde sua vítima atua como voluntário e libera todo seu arsenal de cantadas de duplo sentido até conseguir um encontro. Claro que até lá dão-se entre eles toda sorte de contratempo, bem ao estilo do nonsense das comédias físicas dos anos 1980, mas o diretor acha o equilíbrio perfeito entre as palhaçadas de Lawrence e a introspecção de Feldman, o sal do filme.
“Que Horas Eu Te Pego?” mantém o ritmo cômico até a farsa tornar-se de fato um relacionamento, com todas as complicações que isso sugere. Na sequência em que Maddie e Percy tem afinal seu jantar de formatura tardio Stupnitsky explora a vocação romântica de seu longa. Feldman leva uma interpretação original e matadora para “Maneater” (1982), o inesquecível pop rock new wave de Hall & Oates, atraindo os olhares de todo o restaurante e de uma certa Natalie.
Lamentavelmente, o filme deriva por circunstâncias menos sagazes depois desse ponto; todavia, o que Lawrence e Feldman já haviam mostrado até então justifica com folga os 103 minutos.
★★★★★★★★★★