“Onze Homens e um Segredo” é o exemplo mais elegante da combinação de cálculo e carisma. Sob o comando de Steven Soderbergh, o longa de 2001 faz algo que o cinema de assalto raramente consegue: transformar o crime em espetáculo, o planejamento em coreografia e a camaradagem em sedução. Em vez de apenas narrar um roubo, o filme encena uma ode à esperteza, não a brutal, mas a engenhosa, a que se move com o mesmo ritmo de uma música tocada por quem domina o instrumento.
O projeto parte de uma premissa simples, um ex-presidiário reúne dez cúmplices para roubar os cofres dos cassinos mais poderosos de Las Vegas, mas o interesse nunca esteve na lógica do crime. O prazer do filme reside em observar a forma como Soderbergh orquestra o impossível com a precisão de quem conhece a engrenagem dos grandes espetáculos. Danny Ocean, interpretado por George Clooney, age como maestro de uma sinfonia composta por trapaceiros de diferentes talentos e egos, e o resultado é uma partitura em que cada gesto tem peso, cada olhar possui função narrativa.
A força do elenco é indiscutível. Clooney e Brad Pitt personificam o tipo de carisma que o cinema americano transformou em patrimônio cultural. São astutos sem arrogância, charmosos sem afetação, uma dupla que entende o valor da pausa, do olhar cúmplice e do silêncio carregado de humor. Julia Roberts, embora subaproveitada, injeta no filme um toque de melancolia discreta, lembrando que, sob a superfície reluzente do golpe, há também feridas sentimentais. Andy Garcia, como o vilão refinado, traduz a crueldade em economia de gestos, um antagonista que não precisa gritar para impor poder.
O que realmente distingue “Onze Homens e um Segredo” é a sua estética de leveza. Soderbergh filma com a fluidez de quem se diverte com o próprio jogo, a câmera desliza entre espelhos, luzes e corredores de cassino como se também participasse do roubo. Las Vegas, mais do que cenário, é personagem: uma cidade que encarna a ilusão como princípio, onde cada roleta gira com a promessa de vitória e a certeza da trapaça. É nesse terreno de falsos brilhos que o grupo de Ocean encontra sua verdadeira glória, não no dinheiro, mas na arte de enganar o sistema que vive de enganar.
Há, contudo, uma ironia fundamental: o filme é tão meticuloso em sua construção que o espectador, mesmo ciente da improbabilidade do plano, acredita em cada detalhe. Essa suspensão da descrença não vem da coerência do roteiro, mas do encantamento provocado pelo jogo de aparências. Tudo é cuidadosamente articulado para que o impossível pareça natural, e o natural, fascinante. A direção confere ritmo, humor e uma elegância que remete aos grandes filmes de entretenimento clássico, mas com a autoconsciência moderna de quem sabe que o charme, hoje, é também uma forma de inteligência.
O sucesso do filme está em compreender que o prazer de ver um golpe bem-sucedido não está no roubo em si, mas no espetáculo de sua execução. O público é cúmplice, não porque torce pelo crime, mas porque reconhece na audácia dos personagens uma espécie de resistência ao tédio, a recusa de se conformar com a previsibilidade. No fundo, “Onze Homens e um Segredo” fala menos sobre dinheiro e mais sobre estilo, menos sobre vingança e mais sobre controle: a habilidade de manipular um universo caótico com o mesmo cuidado com que se distribuem cartas em uma mesa de pôquer.
Soderbergh, que sempre transitou entre o cinema autoral e o comercial, constrói aqui uma ponte rara entre o glamour e a inteligência. Seu filme é um lembrete de que o entretenimento pode ser sofisticado quando recusa a pressa e aposta na precisão do ritmo, na sincronia dos corpos e na leve ironia dos diálogos. O que fica não é o ouro do cofre, mas a sensação de ter testemunhado um golpe contra a mediocridade, um assalto executado com charme, humor e um senso de timing que o cinema atual raramente ousa revisitar.
★★★★★★★★★★