Você vai assistir com um sorriso no rosto: romance de ação de Luc Besson acaba de chegar ao Prime Video Divulgação / Kinology

Você vai assistir com um sorriso no rosto: romance de ação de Luc Besson acaba de chegar ao Prime Video

A história acompanha o salto de alguém comum para uma zona de risco emocional guiada por pressa e fascínio; em “June e John”, Luke Stanton Eddy e Matilda Price estrelam sob direção de Luc Besson. A abertura estabelece um cotidiano desbotado, no qual decisões são adiadas até que um encontro inesperado desloca o eixo e impõe movimento. A partir desse gatilho, a narrativa prefere o presente contínuo ao retrocesso explicativo, e o efeito é o de uma estrada que se desenha enquanto os personagens correm. Esse recorte temporal confere vitalidade às ações e concentra a atenção no que cada gesto pode custar no minuto seguinte.

Besson filma com economia de meios e aposta em locações que preservam ruídos de cidade, luzes instáveis e texturas que imprimem urgência. Planos próximos a corpos e superfícies sugerem velocidade, enquanto cortes sincronizados à batida da música empurram a percepção para frente. Não há luxo visual gratuito: o desenho das cenas busca o essencial de cada situação e explora diagonais, contraluzes e reflexos para marcar o deslocamento constante. A clara preferência por trajetos, esquinas e passarelas evidencia um cinema interessado na potência dramática do deslocamento urbano, transformando passos acelerados em declaração de intenções.

O par central funciona como motor dramático. John aparece como homem exausto, educado para não chamar atenção; June encarna a faísca que pede pressa, negociando risco com sorriso largo e olho clínico para atalhos. A química entre Luke Stanton Eddy e Matilda Price nasce de reações e silêncios, sem recorrer a discursos autoexplicativos. Olhares, pequenas hesitações e decisões tomadas no impulso comunicam cumplicidade em formação. Esse entendimento rápido justifica adesões que, de outro modo, soariam inverossímeis, e faz com que cada mudança de rota pareça consequência direta da confiança que se constrói de forma fragmentada.

A música cumpre papel de propulsão. Faixas escolhidas para marcar viradas de humor e passagens de tempo se somam a um desenho sonoro atento a sirenes, motores e passos, compondo a sensação de que o mundo continua em marcha mesmo quando os protagonistas param para respirar. Em alguns trechos, a trilha substitui falas e realça decisões silenciosas, mantendo o andamento e sublinhando a precariedade do momento. Quando o som recua e o silêncio abre espaço, o filme encontra instantes de vulnerabilidade que revelam o peso acumulado pelas escolhas recentes.

Nem tudo se mantém no mesmo patamar. O roteiro insiste na reiteração do conflito entre impulso e consequência, variando cenário e intensidade, mas voltando ao mesmo impasse com frequência. Em certas passagens, diálogos alongados explicam o que a encenação já sugerira com clareza. Essa repetição cobra vigor no miolo, quando a expectativa por novas dobras dramáticas cresce. Ainda assim, Besson encontra soluções visuais que renovam o interesse: enquadramentos que isolam a dupla em espaços amplos, jogos de espelho que diminuem as figuras diante do entorno e cortes que fazem da passagem de um corredor um pequeno triunfo contra a inércia.

A presença de uma ameaça concreta não transforma o filme em obra de perseguição contínua, mas acrescenta espessura ao romance. O risco deixa de ser apenas sensação para ganhar contorno material, o que reorganiza prioridades do casal e acelera decisões. Essa mudança não exige grandes set pieces; basta a lembrança de que o tempo disponível pode encolher a qualquer momento. O resultado é um estado de alerta que mantém a narrativa viva, evitando que a euforia inicial se transforme em rotina e permitindo que o espectador dimensione custos imediatos.

Os recursos modestos, longe de limitar, favorecem descobertas. Ruas pouco reconhecíveis, interiores simples e objetos de uso comum tornam a cidade um território de improviso. Há inventividade em fazer do carro um prolongamento de decisões apressadas, da escada um convite à pressa e de uma porta qualquer a possibilidade de virada. Essa abordagem dá ao filme um frescor que dialoga com fases mais leves da carreira do diretor, quando a curiosidade por gestos e ritmos cotidianos orientava tanto quanto a ambição por grandes cenários. O olhar aqui se fixa no que cabe na mão: uma chave, um celular, um bilhete, elementos suficientes para acender situações.

As atuações apostam na fisicalidade. Luke Stanton Eddy encontra no corpo curvado e nos olhos cansados a marca de um homem sem horizonte, e essa contenção torna convincente a faísca tardia que o leva a sair da linha. Matilda Price, por sua vez, comunica cálculo e ternura em doses alternadas, evitando o estereótipo da musa caótica ao delinear alguém que conhece as próprias limitações e escolhe avançar apesar delas. Juntos, constroem uma parceria que convence não pela eloquência, mas pelo modo como um completa o outro na hora de decidir, gesto a gesto.

Sem recorrer a revelações grandiloquentes, o filme propõe que amar, aqui, é tomar a dianteira diante de um relógio que não dá trégua. A cada nova escolha, os protagonistas testam até onde podem ir sem perder o pouco que ainda lhes garante proteção. A cidade, com seus fluxos e barulhos, se torna coadjuvante ativo, oferecendo atalhos e armadilhas. Quando um plano falha, outro se apresenta, e essa sucessão de tentativas guarda a graça do improviso e o risco da pressa. O interesse nasce dessa alternância entre euforia e cautela, sensação de acaso e cálculo.

Na reta derradeira, a narrativa desacelera o suficiente para que o peso acumulado apareça no rosto dos personagens. Não se trata de julgar escolhas, mas de medir consequências que já não cabem em slogans sobre liberdade. O filme sustenta a ideia de que alguns dias intensos podem alterar a memória de uma vida inteira, sem vender soluções fáceis. A última curva aponta para um horizonte que combina lucidez e desejo, lembrando que urgência tem custo e que, ainda assim, certos encontros justificam a aposta. Essa combinação de risco e ternura sustenta a lembrança que permanece após as luzes se acenderem.

Filme: June e John
Diretor: Luc Besson
Ano: 2025
Gênero: Comédia/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★