Pause o drama da vida e dê play na comédia romântica mais divertida da Netflix Divulgação / Netflix

Pause o drama da vida e dê play na comédia romântica mais divertida da Netflix

Ninguém ama impunemente. O verdadeiro amor leva muito tempo para se realizar em plenitude, o que significa passar por cima das próprias vontades — por mais certo que se possa estar — bater de frente com as opiniões e conceitos ditos certos, abdicar dessa mesma certeza em nome do que o outro considera imprescindível à felicidade, sua e do casal, ainda que, novamente, se saiba muito bem aonde levarão os sonhos que nascem mortos, sem qualquer chance de vingar, de um e do outro. O amor verdadeiro nasce sem pretensões e sem pressa. O coração torna-se mais e mais esperançoso, entende os silêncios e celebra cada pequena vitória, ansiando pelo sonhado final feliz. Luta-se para dar novo sentido às fantasias pueris sobre amor eterno e folguedos de alcova para além da idade adequada, e no processo de queima desse fogo que arde sem se ver os olhos brilham. Charles Van Tieghem esquadrinha uma face particularmente melindrosa do amor em “O Melhor Amigo”, uma comédia romântica cheia dos irresistíveis lugares-comuns do gênero. Com alguma poesia, Van Tieghem e o corroteirista Stanislas Carré de Malberg fixam-se nas diferenças e nos pontos de contato entre amantes e amigos, replicando uma fórmula de que o público costuma gostar. 

Uma despedida de solteira na Riviera Francesa junta o enfermeiro parisiense Thibault Galland a um pelotão de belas mulheres, que entram nuas no mar na primeira cena do filme. Ele permanece na areia porque não trouxe os tampões para os ouvidos, e desperta a atenção de um português, também sem roupa. Quando suas amigas, Alexandra, Lulu e Maud, sobem para seus quartos, ele resolve refrescar-se um pouco, despe-se e mal chega à água tem de sair, tentando fazer com que um funcionário não leve por engano a camiseta e a bermuda que havia deixado junto com a toalha. Entre desesperado e furioso, ele tenta contornar sua pequena tragédia, até aparecer Rose, que pisa num peixe-aranha e tem de ser socorrida de imediato, sob pena de sofrer um derrame caso o veneno do bicho circule. Van Tieghem extrai da situação o máximo de humor involuntário, pontuando os diálogos com o romantismo que cabe. Thibault, ou Titi para os mais chegados, leva Rose no colo até o quarto dela, esforça-se para neutralizar a toxina com um secador de cabelo e, para ele, este é o princípio de um relacionamento amoroso. Só para ele.

Quando voltam para Paris, Titi e Rose continuam a se encontrar, numa amizade sem os benefícios sexuais insinuados pelo título original. Ele se arruma, vai à casa dela com preservativos no bolso, quase diz que está apaixonado e ela se faz de desentendida. Mickaël Lumière e Eva Danino compõem o anticasal de “O Melhor Amigo” valendo-se da dose certa de humor melancólico, mas a interação entre Lumière e as personagens de Manon Azem, Fadily Camara e Constance Arnoult é o que verdadeiramente sustenta a história. Enquanto Maud, a lésbica feminina interpretada por Azem, arrasta Titi para corridas durante as quais ensina seus truques para enlouquecer uma mulher, a Lulu vivida por Camara o leva para aulas de dança de salão e a Alexandra de Arnoult exige que fale menos e aja mais. O diretor preenche lacunas narrativas incluindo a subtrama protagonizada por Eloïse Valli na pele de Jennifer Paoli, uma influenciadora digital conhecida como a Kardashian Francesa. Isso faz com que o filme perca um tanto o ritmo, mas felizmente nem preserva-se a aura lúdica e despretensiosa do começo.

Filme: O Melhor Amigo
Diretor: Charles Van Tieghem
Ano: 2021
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.