O amor nasce do desejo de ser eterno, mas desliza no balanço das horas. Às vezes, duas pessoas encontram-se na quadra mais incerta da vida, quando os sonhos de cada um movem-se em sentidos opostos, e o que poderia ser uma união para além deste triste plano fenece qual o primeiro raio de sol numa manhã de tempestade. Nesses momentos de desarmonia, contudo, é que o amor nos lembra que acontece não quando queremos, mas na ocasião invisível em que sente-se maduro e desabrocha, sem se importar com o que venham a dizer os melancólicos. Quando é necessário se despedir, as boas memórias ficam, e a saudade vai doendo e ensinando. Lasse Hallström erige em “O Mapa Que Me Leva Até Você” um drama romântico que explora as camadas mais intimistas de um relacionamento, numa abordagem entre poética e filosófica. Tarimbado no gênero, Hallström, diretor de sucessos como “Gilbert Grape — Aprendiz de Sonhador” (1993), e “Quatro Vidas de um Cachorro” (2017), extrai do roteiro de Leslie Bohem e Vera Herbert, uma adaptação do romance homônimo de J. P. Monninger, a essência de uma narrativa universal, que também por isso emociona.
Uma longa viagem é o ponto de partida do relacionamento de Heather e Jack, que em comum têm apenas a juventude. Hallström aposta no choque entre essas duas almas radiantes, mais e mais incontornável à medida que a história toma corpo. Heather, uma texana de classe média, está prestes a assumir um posto na diretoria de um banco, enquanto Jack… bem, Jack é um enigma. Ele parece ter dinheiro e ascendência nobre, mas perambula pelo Velho Mundo em roupas demasiado largas, praticando a habilidade em malabarismo em circos mambembes e feiras de rua. Eles trocam palavras gentis depois que Jack faz de cama o bagageiro de um trem com destino a Barcelona e na sequência reparam que ambos estão lendo“O Sol Também se Levanta” (1926), o romance de Ernest Hemingway (1899-1961) sobre as desilusões de um grupo de expatriados norte-americanos e ingleses quando chega ao fim a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Heather viaja com Amy e Connie, as amigas interpretadas por Madison Thompson e Sofia Wylie, e juntos os quatro contemplam o Templo Expiatório da Sagrada Família e outras atrações da Catalunha, de dia, enquanto vão esbaldar-se em festas barulhentas quando a noite cai.
É numa dessas que Amy conhece Viktor, um ladrão inglês, e Connie apaixona-se por Raef, um amigo de Jack, até se separarem. É o gancho de que o diretor precisava para explorar a relação de Heather e o novo pretendente, e o possível casal percorre os lugares onde o bisavô de Jack estivera meio século antes, quando serviu como soldado durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Essas anotações constam do diário do bisavô que Jack guarda como um tesouro, o discreto MacGuffin da narrativa. Jack orienta-se por seu talismã, pensando “viver o presente” e se tendo por superior porque não perde tempo com foto e post nas redes sociais. O filme torna-se meio pedante aí, com a artificiosa discussão dos protagonistas a respeito do que é a realidade ou sua manipulação pelo homem. Madelyn Cline e K.J. Apa encaram uma prova de fogo para sustentar a verossimilhança dos personagens, mas saem chamuscados. Ninguém esclarece ainda como é que o dinheiro jamais se acaba — Jack surrupiara cinco mil euros de Viktor no momento em que buscar os pertences de Amy na casa do malandro, mas não é o bastante —, e, para concluir, há o velho truque da doença terminal, agindo há alguns meses sobre o mocinho. Hallström encerra “O Mapa Que Me Leva Até Você” com um final aberto, no qual muitas indagações permanecem no ar. E o público, desorientado.
★★★★★★★★★★