Eclipsando pelo peso das estreias, marketing das grandes franquias e os lançamentos do ano, filmes passam despercebidos no catálogo da HBO Max. Produções que não apostam no espetáculo ruidoso e imediato, mas em narrativas densas, íntimas e reveladores. Descobri-las é como reencontrar o prazer de um cinema que valoriza a linguagem, o silêncio e os personagens complexos. A Revista Bula buscou três filmes disponíveis na plataforma para apresentá-los aos leitores. Entre eles, está um que figura entre os favoritos de ninguém menos que Martin Scorsese, cineasta que sempre defendeu o poder transformador da sétima arte.
Se um filme merece o selo de aprovação de Scorsese, você sabe que nele há algo maior que um enredo comum: há forma, visão e intensidade. Ao lado dele, outras obras que exploram diferentes lados de temas contemporâneos, que falam sobre as relações humanas e o impacto da tecnologia nas nossas vidas. Essa lista é uma oportunidade de olhar para fora da lógica das estreias milionárias. Esses enredos conversam com o presente e oferecem experiências perturbadoras e sensíveis que ajuda a ver o quanto ainda existe espaço para histórias originais dentro dos streamings.

Dois adolescentes, cada um preso à sua rotina sufocante em uma cidade do interior, descobrem na televisão um canal noturno misterioso que exibe uma série enigmática e aparentemente feita apenas para eles. À medida que passam a acompanhar os episódios, começam a questionar não apenas a realidade em que vivem, mas também suas próprias identidades. As histórias exibidas parecem falar diretamente às suas angústias, dando corpo a sentimentos que eles não conseguem expressar em palavras. Entre o fascínio pelo que assistem e o medo de perderem a si mesmos nesse universo, ambos se tornam cada vez mais envolvidos por essa experiência coletiva e solitária ao mesmo tempo. O brilho da tela não funciona apenas como escapismo, mas como um portal para outra existência possível, onde os limites entre fantasia e vida real se dissolvem. O resultado é um retrato sensível da adolescência como um estado de transição, marcado por incertezas, desejo de pertencimento e a dolorosa busca por um lugar no mundo.

Uma analista de tecnologia trabalha em casa revisando falhas de um assistente virtual de voz. Entre áudios triviais de usuários, ela se depara com uma gravação que sugere a ocorrência de um crime. Ao tentar denunciar o que descobriu, esbarra na resistência de sua empresa, que prefere abafar o caso a investigá-lo. Isolada, marcada por crises de ansiedade e assombrada pelo medo de sair de casa, a protagonista precisa enfrentar tanto seus limites pessoais quanto um sistema que a enxerga como obstáculo. À medida que se aproxima da verdade, descobre-se também em meio a uma trama de espionagem, manipulação corporativa e violência. O filme revela o contraste entre a aparente neutralidade da tecnologia e a forma como ela pode se tornar instrumento de controle e silenciamento.

Após sobreviver a um trauma coletivo em sua escola, uma adolescente vê sua vida ser irremediavelmente transformada. Amizades antigas perdem o sentido, as conversas com a mãe se tornam mais tensas e os silêncios ocupam cada vez mais espaço em seu cotidiano. Aos poucos, ela cria uma inesperada conexão com outro jovem que também esteve presente no mesmo acontecimento, e juntos tentam encontrar uma forma de seguir em frente. O que surge dessa relação não é exatamente um romance convencional, mas um vínculo que mistura apoio, fragilidade e cumplicidade. A protagonista descobre que viver “depois” significa conviver com a ausência, mas também abrir espaço para novos afetos e possibilidades. O filme é um retrato delicado de como a dor pode ser enfrentada por meio de pequenas esperanças.