Super-heróis de correntes as mais variadas, dos mais solares ao mais chegados ao mundo das trevas, têm um ponto em comum: lutam contra as memórias de uma infância triste, que, claro, ficam naquele eterno vaivém que os predispõem a se lançar a empreitadas cada vez mais arriscadas, quiçá até suicidas, visando não somente o bem da humanidade, mas um acerto de contas com sua própria vida. Elektra Natchios, uma matadora de aluguel com um passado sombrio, aceita uma nova encomenda movida por um sentimento de autoafirmação (e dois milhões de dólares), mas acaba desistindo, o que significa assinar uma sentença de morte. Elektra, a personagem-título do filme de Rob Bowman, fez sua estreia na tela grande em “Demolidor: O Homem sem Medo” (2003), de Mark Steven Johnson, despertou tamanho interesse que ganhou vida própria. O roteiro de Johnson, Frank Miller e Zak Penn ilumina os recônditos obscuros da personalidade de Elektra de modo a oferecer possíveis justificativas para o jeito como escolhe viver, sugerindo também mudanças de percurso. Tudo de acordo com as soluções ligeiras das histórias em quadrinhos da Marvel.
A fotografia de Bill Roe enche de um tom soturno boa parte dos 104 minutos do filme, e Elektra é mostrada como uma mulher que persevera para mudar de vida e dessa forma redimir-se consigo mesma. Os conflitos internos da protagonista viram um material de que Bowman tira máximo proveito, num esforço sincero de fazer dela uma figura independente, mas apagar “Demolidor” do currículo de Elektra, além de desonesto, veda a muitos plena compreensão do enredo. A Ordem da Mão, uma organização japonesa secreta, está em busca de um certo tesouro, e aí começam os problemas. Águias, lobos e cobras saem das tatuagens de seus membros e atacam pessoas, e quando não estão encastelados num escritório no alto de um arranha-céu de Tóquio, esses criminosos ocupam-se em encharcar-se de saquê e desfiar anedotas de que só eles ririam. O diretor recorre a flashbacks na intenção de sublinhar a infância desditosa de Elektra, e tem-se uma ideia de sua resistência a certos ambientes e sua preferência por outros.
Jennifer Garner faz quase tudo o que está ao seu alcance, mas as cenas de luta, que tomam forma sem muito preparo e se encerram pouco depois, comprometem o desempenho da atriz. As interações de Garner com Terence Stamp, na pele de Stick, um mestre de artes marciais cego, tinham o potencial de conferir uma medida generosa de substância dramática, especialmente no que resta apenas subentendido, mas são comprometidas pela afobação de Bowman. Goran Višnjić e Kirsten Prout tampouco ganham o destaque que serviria de mote para um segmento considerável do filme e dessa maneira “Elektra” termina como começou: no escuro.
★★★★★★★★★★