O filme mais assistido do Prime Video agora — e depois de dar play, você não vai querer sair de casa Divulgação / A24

O filme mais assistido do Prime Video agora — e depois de dar play, você não vai querer sair de casa

Parece que diretores de todas as colorações ideológicas, que professam fés as mais variadas, com visões de mundo mesmo incoerentes com o ofício de que tiram o sustento são de quando em quando acometidos de uma descrença fundamental da vida, que não raro dá em trabalhos de teor escatológico em maior ou menor grau. Conflagrações bélicas parecem ter se tornado uma ideia fixa para Alex Garland, e o diretor sempre encontra um ângulo por ser desbravado neste seu assunto favorito, como acontece em “Tempo de Guerra”. A história de um pelotão de fuzileiros da Marinha americana que cai numa patética armadilha durante a campanha no Iraque, em 2006, é mais uma das incontáveis provas de que guerras sempre hão de manter seus segredos impublicáveis porque humilhantes, inclusive do lado que se pensa mais poderoso. Dessa vez, Garland contou com Ray Mendoza, consultor militar em “Guerra Civil” (2024), e personagem da verdadeira história, e também por essa razão o roteiro dos dois é uma joia do mais puro realismo, salientado pela edição de Fin Oates, a fotografia de David J. Thompson e a sonorização, a cargo de uma equipe de 23 profissionais. 

Mendoza é um dos homens em missão em Ramadi, cidade à beira do rio Eufrates e a pouco mais de cem quilômetros a oeste de Bagdá, território sem lei cujos perigos só mesmo quem esteve lá conhece. D’Pharaoh Woon-A-Tai confere ao anti-herói um ar ingênuo e uma capacidade de se indignar que vai minando conforme os dias se sucedem, até que não possa restar mais nada além de uma mistura indigesta de desalento e ódio. Cenas como aquela em que ele e os outros soldados reúnem-se diante da televisão para assistir ao conteúdo de uma aula de ginástica com mulheres em roupas sumárias é das poucas ocasiões em que o diretor dá alguma pista quanto ao ânimo da tropa nos intervalos entre um e outro combate, anestesiados pelo medo de que esse talvez seja seu último momento de prazer, ainda que tão frugal, algo de que eles decerto não haviam precisado até outro dia.

Na sequência de abertura, Mendoza e seus companheiros entram numa casa em cujo interior uma família dorme e a mantém em cativeiro, usando a casa como uma base privilegiada para observar a ação do inimigo. Quase imediatamente, tem início uma curiosa movimentação, a que o espectador mais atento só passa a dar importância passados alguns minutos. Um veículo de combate Bradley, destinado a resgatar os militares, vai pelos ares depois que um petardo caseiro o alcança, e o comando acha melhor não enviar outro, para não  estourar o orçamento. Com toda a sutileza, Garland tece sua crítica aos equívocos da política externa da Casa Branca, um mal-estar que o silêncio de determinadas passagens ecoa. A essa altura, já se sabe que não há nenhuma chance de que esta história acabe bem, e não há quem não se flagre receoso quanto ao potencial de destruição da próxima guerra. 

Filme: Tempo de Guerra
Diretor: Alex Garland e Ray Mendoza
Ano: 2025
Gênero: Ação/Drama/Épico
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.