A alma de cada homem, em maior ou menor proporção, é dotada de demônios, silenciosos ou estridentes, pacificados ou sempre dispostos a tentar uma próxima cartada. “Mãe!” poderia ser encarado como o episodio final da trilogia sobre Deus e seus desígnios, iniciada por Darren Aronofsky com “A Fonte da Vida”, que se desdobrou em “Noé” (2014).
Há filmes que necessitam um tempo um pouco mais prolongado para sair do zero a zero, cujo ponto de ignição pode até demorar a ser alcançado, mas uma vez que se o atinge, cada segundo vale a pena. “O Homem das Mil Caras”, do diretor espanhol Alberto Rodríguez, é uma dessas histórias meio temperamentais, que só passam a fazer sentido quando sentem-se maduras o suficiente, mas que em compensação podem entregar muito mais do que prometem.
A história que a diretora decidiu contar aqui — a desagregação de uma família por causa de uma guerra entre povos até então próximos, e a posterior instalação de uma tirania comunista —, não obstante tropece em aspectos históricos pontuais, prima pela ousadia e beleza.
Fazer algo novo, trazer à baila iluminações sobre temas que se acreditavam superados é para quem estrela, corpo celeste dotado de luz própria que ilumina os demais. Na constelação de falsos brilhantes e satélites perdidos do cinema, figura, ou melhor, continua a figurar Jim Jarmusch, que com joias como “Os Mortos não Morrem”, deixa claro que certas coisas precisam ser ditas até o fim dos tempos.
Cada vez mais plural, mais complexo, mais rico e, sobretudo, sempre pleno de sensibilidade, os filmes espanhóis têm refletido a ânsia por sensibilidade, por beleza, abordando os assuntos atávicos do homem de um jeito arrojado. Como faz a diretora María Ripoll em “Viver Duas Vezes”, em que conduz um drama com toda a comicidade de que a tristeza também se reveste.
