Autor: Giancarlo Galdino

É muito mais instigante acompanhar o crescimento de uma história do ponto de vista da total surpresa quanto ao que autor, diretor e elenco querem verdadeiramente nos fazer imaginar do que se entregassem tudo de imediato, de bandeja, restando a nós apenas o espanto. Jeremy Saulnier se comporta exatamente dessa forma em “Noite de Lobos” ao levar sua audiência a estabelecer vínculos com a trama que, conforme se vai ver, não se sustentam em pé.

“RRR”, um retroacrônimo para “Rise, Roar, Revolt” (“crescer, rugir, revoltar-se”, em tradução literal), toma a história da Índia pré-independência no início do século 20 e a transfere para dois personagens, dois insurgentes já sem muita paciência para viver numa colônia, paralisada por limitações econômicas, políticas, geográficas, topográficas, sociais.

Diga-se o que se quiser dizer, mas indianos sabem como contar uma história. A esse propósito, a Índia tem um dom verdadeiramente invejável quando se trata de narrar no cinema seus feitos, e em sendo possível temperar a história com fantasia, sem quase nenhum impedimento de ordem lógica, tanto melhor. De tão plural, o cinema hindu foi se desdobrando em várias escolas e em muitas outras ramificações, cada uma trazendo na fachada as qualidades com que pretendia ser reconhecida.

Ver que uma história rica se adapta a diferentes meios tem um gosto fora do comum para a audiência, cuja expectativa acerca da narrativa aumenta. Sucesso na Broadway, “American Son”, texto do dramaturgo e advogado branco Christopher Demos-Brown adaptado para às telas pelo diretor negro Kenny Leon, se encaixa ao formato do cinema replicando na tela a mesma força vista nos palcos ao jogar luz sobre a cada dia mais intrincada questão racial nos Estados Unidos.

Ao longo dos séculos, os afro-americanos foram se submetendo, com dificuldades maiores ou menores, às tantas metamorfoses que definiram o próprio desenvolvimento dos Estados Unidos, sendo capazes, no entanto, de conservar seu lado telúrico. Os vaqueiros urbanos de “Alma de Cowboy”, o western cheio de estilo de Ricky Staub, ocupam, afinal, o lugar que lhes é devido na história americana por meio do enredo cheio de beleza sobre um reencontro de pai e filho.