Autor: Giancarlo Galdino

Rindo castigam-se os costumes, segundo a máxima latina celebrizada pelo dramaturgo Gil Vicente (1465-1536). Assim também pensa Henry Selick, um dos maiores diretores da animação em stop motion. Em “Wendell & Wild” (2022), seu novo trabalho, Selick agrega a excelência da técnica a uma trama sofisticada, plena de alegorias sobre a eterna necessidade de se fazer escolhas sem prejuízo do sonho, a finitude, as feiuras estética e metafísica do mundo, ao passo que dá suas alfinetadas no capitalismo e na religião.

“Nada de Novo no Front” (2022) não é, com a licença do trocadilho, novidade alguma. Mais recente adaptação do romance homônimo do alemão Erich Maria Remarque (1898-1970), o filme de Edward Berger, compatriota do escritor, reconstitui os passos de uma longa marcha, iniciada em 1929 e protagonizada por um garoto assustadiço, levado a amadurecer na marra em meio à barbárie tão característica de uma guerra.

A vida é esquecimento, segundo o ensaísta espanhol Miguel de Unamuno (1864-1936), e as velhas sagas, para continuar com ele, despertam o interesse de públicos os mais variegados justamente porque este é um universo comum a todos. Desmembrando a vida de um clã que atravessa os anos sem conseguir curar suas feridas, o turco Berkun Oya dá a “Quatro Gerações” (2022) o verniz documental que se espera de um relato dessa natureza, sem prescindir da beleza.

“O Enfermeiro da Noite” (2022) é a história de um assassino em série devotado, que foi deixando um rastro de mortes ao longo de mais de sete anos, mas principalmente o tributo a uma mulher singular. O diretor Tobias Lindholm é hábil em manipular o foco do espectador para uma direção e, aos poucos, fazê-lo notar a grande personagem que deixa a o segundo plano e ocupa o centro do roteiro de Krysty Wilson-Cairns, baseado no livro homônimo de Charles Graeber sobre um evento melancolicamente verídico.

É pela seara espinhosa dos segredos de um ditador colérico que Renato De Maria se embrenha. O italiano, diretor de “Roubando Mussolini” (2022), ataca o fascismo por um de seus pontos mais fracos (e menos conhecidos), a partir de uma sofisticada alegoria, em que um dos líderes mais truculentos da Europa é mostrado como um sujeito de ambições desmesuradas, além de um hipócrita, dado a sustentar amantes ao passo que se anunciava um ferrenho defensor do que entendia como “moral e bons costumes”.