Autor: André J. Gomes

Carta aberta a você que ainda acredita no amor

Carta aberta a você que ainda acredita no amor

Você sabe que tem gente se matando agora, não sabe? Tem um povo bombardeando outro, crianças apavoradas, mulheres subjugadas. Uns homens soltam bombas, outros prendem o choro. Edifícios desabam fáceis, sob a mira dos mísseis prateados, impecáveis. Famílias se desmancham como papelão na enxurrada, canalhas fogem com o dinheiro do povo. Ódio vira regra, medo se faz prática, desespero se torna música. O sucesso de audiência é a nossa escandalosa miséria de todos os dias.

Rubem Alves me ensinou de tudo. Até a chorar a perda do avô que eu nunca tive

Rubem Alves me ensinou de tudo. Até a chorar a perda do avô que eu nunca tive

Pois o último sujeito que escolhi para ser o meu avô foi o Rubem Alves. Leio seus escritos imaginando que cada palavra está sendo dita pelo avô que eu nunca tive. Leio como se ouvisse conselhos do meu velho avô, um homem que no meu mundo de fantasia gosta de plantas e de caqui e de ipês amarelos. Quando o via falando bonito na televisão, pensava comigo mesmo: “esse vovô tem cada uma”. Agora, com a partida dele, me sinto tocado por um sentimento que eu desconhecia: a do luto por meu avô.

Viva João Ubaldo Ribeiro!

Viva João Ubaldo Ribeiro!

É que tem gente que deixa o mundo melhor, né? Tem gente que abre o riso e o tempo. No meio de tanta bobagem, tanto desgosto, tanto ranço, tanta empáfia, tem gente que faz a vida mais simples em toda a sua complexidade. Tempos difíceis, os nossos. Já faz tempo que é assim. É que a gente aprendeu a levar o carro adiante no tranco. Aprendeu o ritmo louco das coisas, descobriu como faz pra seguir em frente quando sobe e quando desce.

Nem sempre o amor começa numa segunda-feira

Nem sempre o amor começa numa segunda-feira

É… nem sempre as coisas vão para onde a gente quer. Nem sempre a vida acontece como você e eu desejamos. Nem sempre. Preciso confessar a você que essas velhas certezas só me enchem de novas perguntas. Amigos verdadeiros nunca faltam mesmo? Amor de verdade não acaba? Só uma mãe entende um filho? O perdão é um privilégio das almas elevadas? Quem sabe? É que eu tenho a impressão de que as verdades de cada um nunca foram, assim, tão absolutas, austeras, esbanjando sisudez. As minhas, pelo menos, andam de tênis.

O amor é um bailarino que convida para a dança

O amor é um bailarino que convida para a dança

Alguém passou aqui dançando. Você viu? Entrou por aquela porta ali, varreu os cômodos rodopiando a leveza dos anjos, girou sobre os pés deslizando pela casa, como se minha casa fosse um enorme salão no meio do mundo todo e a humanidade, seu corpo de baile. Em sua dança, chegou pisando leve, cantando baixinho como quem reza a Nossa Senhora dos Pequenos Milagres para que o afeto seja nosso eterno ato de contrição. E que entre uma pedra e outra do caminho floresçam mudas de bom dia, boa tarde, boa noite, por favor e obrigado.