No imaginário dos Estados Unidos, o Velho Oeste é o berço de heróis e lendas, moldados pela rudeza de uma terra sem lei e pelo desejo incessante de justiça. Durante o século 19, personagens movidos pelo instinto de vingança erigiram uma ordem brutal e implacável, transformando a própria ferocidade em uma arma temida. Estes homens, devotos de um código árido e impiedoso, se tornaram guardiões mundanos de uma moralidade à beira do abismo.
Ron Howard, em “Desaparecidas”, ingressa na linhagem de diretores que exploram esse gênero tipicamente americano, ao lado de John Sturges, Sergio Leone e Lawrence Kasdan. Baseado no romance “The Last Ride”, de Thomas Eidson, o filme subverte expectativas ao colocar uma mulher como protagonista central. Magdalena “Maggie” Gilkeson é uma curandeira resiliente, que administra um rancho e cria suas duas filhas sozinha. A independência de Maggie, porém, é testada quando uma crise familiar obriga-a a recorrer a um aliado inesperado: seu pai, Samuel Jones, interpretado por Tommy Lee Jones.
A trama se desenrola no Novo México, onde Maggie, além de cuidar de suas obrigações diárias, ajuda vizinhos com seus conhecimentos de medicina popular. Entre esses encontros está Brake Baldwin (Aaron Eckhart), um homem que preenche algumas lacunas de sua solidão sem nunca ultrapassar os limites de sua reputação. No entanto, a aparente rotina de Maggie é devastada por uma emboscada apáche que leva à morte de Brake e ao sequestro de Lilly, sua filha mais velha.
O reaparecimento de Samuel é tanto um tormento quanto uma tão necessária salvação. Depois de anos vivendo entre os índios e absorvendo seus costumes, ele carrega uma moral ambígua e uma dor silenciosa. Relutante, Maggie precisa aceitá-lo em sua busca desesperada para resgatar Lilly. A verdadeira essência do filme não está nos confrontos armados ou nas paisagens áridas, mas na tentativa de reconstrução de uma relação dilacerada pelo abandono.
Cate Blanchett entrega uma atuação visceral como Maggie, uma mulher moldada pela adversidade, enquanto Tommy Lee Jones imprime em Samuel uma dignidade áspera e contraditória. Jenna Boyd, como a filha caçula Dot, é a liga emocional que suaviza a dureza da narrativa, enquanto a busca desenrola-se com o peso de um passado inescapável.
“Desaparecidas” é mais do que uma história de resgate; é um retrato de laços familiares corroídos pela distância e pelo tempo, mas que, sob pressão, mostram-se mais resistentes do que o esperado. Em uma época que não perdoa os fracos, a verdadeira força está na capacidade de perdoar e reconstruir, mesmo quando os caminhos parecem irreconciliáveis. Ron Howard conduz essa jornada com maestria, deixando uma marca indelével em um gênero que nunca deixa de explorar os limites da coragem e da redenção.
★★★★★★★★★★