Um jornalista que decide abandonar a profissão após acumular uma fortuna certamente suscita questionamentos, mas Irwin M. Fletcher, surpreendentemente, atravessa os anos sem alarde, colecionando aventuras e romances passageiros. No entanto, um assassinato enigmático ameaça desmoronar sua aparente tranquilidade.
“Confesse, Fletch” tece uma narrativa repleta de intrigas criminais, gângsteres com ramificações globais, policiais apáticos e, é claro, personagens complexos como o próprio Fletch, que evoca o estilo de mestres do cinema como Alfred Hitchcock, Don Siegel, e Terence Young. Esta trama combina suspense, ação, e anti-heróis carismáticos, com uma dose de humor peculiar, resultando em uma obra envolvente, que se destaca em uma era onde o “bom” não é necessariamente novo, e o novo não é sempre bom.
Baseado no romance de Gregory McDonald, publicado em 1974, Greg Mottola revitaliza o noir da franquia iniciada por Michael Ritchie em 1985 com “Assassinato por Encomenda”, apresentando um protagonista com mais carisma que o interpretado por Chevy Chase. A direção de Mottola explora novas atmosferas, beneficiando-se de avanços tecnológicos e da própria evolução cultural para oferecer uma interpretação contemporânea e instigante das histórias de McDonald, que, mesmo sem a freneticidade habitual do gênero, permanecem atuais e provocadoras.
Em filmes de natureza bizarra, a credibilidade dos atores é essencial para ancorar o espectador na narrativa, despertando as emoções necessárias e provocando reflexões. Para compreender a mente de um criminoso, é vital identificar algum traço de humanidade em suas ações, embora seja prudente evitar qualquer glamourização do crime. Contudo, não se pode negar que o amor, por vezes, aproxima o criminoso do homem íntegro, até mesmo sugerindo uma possível redenção.
Jon Hamm entrega a Fletch uma combinação precisa de charme e revela a essência noir do roteiro de Mottola e Zev Borow, que capturam a despreocupação calculada de seu anti-herói. Mesmo diante de um cadáver no luxuoso apartamento que aluga, Fletch mantém uma calma inabalável, e seu relacionamento com Angela de Grassi, a enigmática vamp interpretada por Lorenza Izzo, é secundário em relação à complexa ligação com uma mulher conhecida apenas como A Condessa, papel de Marcia Gay Harden. Este relacionamento abre espaço para um intrigante jogo de gato e rato em torno do desaparecimento de uma valiosa coleção de arte.
O toque cômico de Roy Wood Jr. como Morris Monroe, o indolente inspetor da Polícia de Boston, e de Ayden Mayeri como Griz, a estagiária, adiciona leveza à narrativa, afastando o filme do estereótipo de uma simples história policial. Mesmo com o desfecho em um “lugar qualquer da América Central”, o filme mantém seu charme, oferecendo uma narrativa não linear repleta de nuances e surpresas.
Filme: Confesse, Fletch
Direção: Greg Mottola
Ano: 2022
Gêneros: Comédia/Crime
Nota: 9/10