Uma vez que se consente em viver junto com alguém, deve-se estar disposto a passar por cima dos caprichos que fazíamos questão de cultivar com todo o gosto ao longo dos anos, em nome do bem que o outro nos inspira, ou teria de inspirar. Pelo tempo que dura, um relacionamento nos absorve com maior ou menor intensidade, tanto nos momentos de prazer como nos de desespero, que parecem muito mais resistentes ao avançar das horas, sorrateiros em sua eternidade, deslizando pelas quinas e infiltrando-se pelas gretas das portas até que ninguém mais suporte o mau cheiro. Sempre há soluções fáceis e erradas para problemas complexos e renitentes, e é aí que entra o casal de protagonistas de “Um Clímax Entre Nós”, arrastando uma vida a dois que se esfacela a olhos vistos, até que brilha a luz no fim do túnel que mais ofusca que salva. A holandesa Joosje Duk torce os muitos chavões de seu filme de modo a vislumbrar possibilidades menos óbvias para o enredo, que tolera a inconstância das situações. Conforme a trama vai adquirido substância dramática, nota-se o louvável propósito da diretora, que faz o que consegue para manter aceso o interesse do público.
Uma mulher grita e pula na cama enquanto o namorado espia pelo olho mágico. Ele entra, e nesse momento quem assiste tem uma surpresa bem menos espantosa do que Duk imagina, embora o que se passa na sequência justifique o início um tanto confuso. Mink abre a porta, tira a roupa de Luna e fica a impressão de que, enfim, os personagens de Martijn Lakemeier e Gaite Jansen vão mesmo se entender. Porém, depois de terminados os folguedos de alcova, ela confidencia ao espectador que atingira seu 132º orgasmo fingido, e Duk descortina seu roteiro sobre as inúmeras possibilidades de se dar cabo da questão, todas bastante reducionistas e eivadas de um maniqueísmo constrangedoramente primário, restando ao macho do casal uma função meio decorativa, como se, uma vez que um homem leva para a cama uma mulher, ele é obrigado a saber tudo o que precisa ser feito.
Os truques bem pensados em “Um Clímax Entre Nós”, dispostos ao longo de pouco mais de hora e meia, funcionam até certo ponto, mas tornam-se artificiosos demais, em especial quando da apresentação estabanada de Eve, a garota à primeira vista um tanto leviana interpretada por Joy Delima, que parece não se envergonhar de servir como mero passatempo a Luna, preenchendo seu imensurável vazio enquanto ela não consegue resolver para onde seguir. É quase palpável o esforço da diretora quanto a refazer os claros equívocos na abordagem do conflito que movimenta o eixo da história — sobretudo no que toca a Eve —, mas a sensação de oportunismo, da anti-heroína de Jansen e de Duk ela mesma perdura. O desfecho, no telhado de um prédio, em que, evidentemente, apenas Mink e Luna estão em cena, não poderia ser mais pasteurizado, digno de uma narrativa longe de ter um clímax.
Filme: Um Clímax Entre Nós
Direção: Joosje Duk
Ano: 2023
Gêneros: Romance/Comédia
Nota: 7/10