O atentado de 20 de julho de 1944 contra Adolf Hitler ocupa um lugar central na memória política alemã. Não se trata de um episódio marginal da Segunda Guerra, mas da tentativa mais organizada de ruptura interna dentro do próprio regime nazista. O roteiro acompanha Claus von Stauffenberg, interpretado por Tom Cruise, desde sua atuação no norte da África até sua entrada no núcleo da conspiração militar em Berlim. Gravemente ferido durante um bombardeio britânico, Stauffenberg perde o olho esquerdo, a mão direita e dois dedos da mão esquerda. A mutilação não serve apenas como marca física, mas como sinal de um oficial que passa a enxergar o regime como um projeto de autodestruição nacional. A partir desse ponto, o filme deixa claro seu recorte: não há interesse em redenção moral abstrata, mas na lógica prática de um golpe planejado por homens treinados para obedecer, agora forçados a agir contra a hierarquia que os formou.
Stauffenberg como figura política
A composição de Tom Cruise evita qualquer romantização tardia. Seu Stauffenberg é rígido, contido e frequentemente opaco. Essa escolha aproxima o personagem de um agente político, não de um herói trágico. Ao ingressar no círculo liderado por Henning von Tresckow, vivido por Kenneth Branagh, o protagonista passa a operar dentro de uma rede marcada pela desconfiança e pelo cálculo constante. O filme explicita o paradoxo central do complô: derrubar Hitler exigia utilizar os próprios mecanismos legais do regime. O plano Valquíria, originalmente criado para conter rebeliões internas, é reprogramado para legitimar um golpe militar após a morte do Führer. Essa inversão jurídica é o eixo dramático da narrativa e também seu comentário mais incisivo sobre como Estados autoritários podem ser sabotados apenas a partir de suas próprias engrenagens.
A engrenagem do poder e seus cúmplices
Entre os personagens centrais, Friedrich Fromm, interpretado por Tom Wilkinson, representa a ambiguidade moral do alto comando. General da Reserva, Fromm conhece a conspiração, mas evita comprometimento direto, aguardando para alinhar-se ao lado vencedor. Essa postura oportunista contrasta com figuras como Ludwig Beck, vivido por Terence Stamp, cuja oposição ao regime é ideológica, ainda que marcada por hesitação. Kenneth Branagh constrói um Tresckow exausto, consciente de que a conspiração já nasce cercada por falhas humanas. O roteiro enfatiza que o fracasso não decorre apenas de acaso, mas da soma de pequenas covardias, atrasos e disputas internas. Ao evitar discursos inflamados, o filme opta por diálogos funcionais, muitas vezes secos, que refletem a natureza burocrática do mal que tentam combater.
Execução do atentado e desfecho
A sequência do atentado na Toca do Lobo concentra o núcleo dramático do filme. Stauffenberg, limitado fisicamente, luta contra o tempo para armar a bomba enquanto circula entre oficiais que desconhecem o plano. A falha do explosivo, deslocado por acaso, não é tratada como ironia do destino, mas como demonstração de fragilidade estrutural. O golpe em Berlim se desfaz rapidamente, revelando a ausência de adesão efetiva do Exército. A execução sumária dos conspiradores encerra a narrativa sem catarse. Bryan Singer constrói um thriller histórico que se recusa a oferecer conforto. “Operação Valquíria” não transforma seus personagens em mártires absolutos, nem relativiza o regime que serviram. Ao expor a conspiração como um gesto tardio, porém real, o filme sustenta uma reflexão incômoda sobre responsabilidade política e o custo de agir apenas quando todas as alternativas já se esgotaram.
★★★★★★★★★★





