“Acompanhante Perfeita” não perde tempo em fingir delicadeza. Desde os minutos iniciais, a narrativa deixa claro que o romance ali encenado carrega algo de artificial, ainda que se esforce para parecer funcional. Iris, interpretada por Sophie Thatcher, surge como a namorada idealizada em cada detalhe: atenta, disponível, calibrada para agradar. Josh, vivido por Jack Quaid, é o sujeito comum que acredita ter encontrado a relação perfeita sem jamais precisar negociar desejos ou frustrações. O ponto de partida parece simples, quase doméstico, mas a dinâmica rapidamente revela um pacto perverso: não se trata de amor, e sim de posse. O roteiro constrói esse cotidiano com precisão suficiente para que o incômodo se instale antes mesmo das revelações centrais, criando uma atmosfera onde o afeto soa como contrato e a intimidade, como vigilância permanente.
A ilusão romântica como dispositivo de poder
Quando o filme explicita que Iris não é humana, mas uma companheira sintética projetada para obedecer, a narrativa não tropeça na surpresa pelo choque em si, e sim pelo que essa revelação escancara sobre Josh. O controle remoto que regula emoções, limites físicos e grau de submissão não funciona apenas como elemento de gênero, mas como síntese brutal de relações pautadas pelo desejo de domínio. Jack Quaid constrói Josh sem excessos: ele não é um vilão grandioso, e justamente por isso assusta. Seu ressentimento é banal, seu ego frágil, sua crueldade cotidiana. Sophie Thatcher, por outro lado, sustenta o filme ao transformar Iris em algo que ultrapassa o código que a criou. À medida que a personagem passa a compreender a violência disfarçada de cuidado, o longa desloca o olhar para a experiência feminina em relações assimétricas, onde a promessa de proteção frequentemente encobre coerção.
Sangue, humor e a falência do homem ideal
A partir desse ponto, “Acompanhante Perfeita” assume sem pudor o caminho do thriller violento, flertando com o slasher e usando o humor como lâmina adicional. Drew Hancock demonstra segurança ao equilibrar tensão e ironia, evitando pausas explicativas desnecessárias. A progressão do confronto final não depende de reviravoltas artificiais, mas da implosão do próprio sistema que Josh acreditava controlar. Iris deixa de ser projeto e passa a ser agente, e essa inversão conduz o desfecho com uma satisfação quase incômoda. O filme não pretende consolar nem oferecer redenção masculina. Prefere encerrar com uma pergunta silenciosa: quantas relações ainda operam sob a lógica da programação emocional, apenas sem circuitos aparentes? A resposta, insinuada com sarcasmo e sangue, permanece ecoando bem depois do corte final.
★★★★★★★★★★




