O filme mais bonito que você verá neste mês de novembro, baseado na obra-prima de Jack London, acaba de chegar à Netflix Divulgação / 20th Century Studios

O filme mais bonito que você verá neste mês de novembro, baseado na obra-prima de Jack London, acaba de chegar à Netflix

Não é de hoje que os filmes de cachorro constituíram um gênero cinematográfico — e dos mais exitosos. Essas produções costumam agradar porque vão no cerne de um sentimento nobre e cada vez raro, que inspira os poetas e estimula a reflexão do homem comum. Lealdade é um traço incontornável da personalidade canina, bálsamo milagroso capaz de acalmar nossa urgência por afeto, evocando a lembrança de vínculos reais ou desejados. Este é um dos pontos que Chris Sanders toca em “O Chamado da Floresta”, drama pleno de beleza e ritmo. O roteiro de Michael Green bebe do clássico de Jack London (1876-1916), publicado em 1903, mas encontra brechas para uma versão mais autoral e ancorada na tecnologia. A magia, entretanto, não se perde.

Habilidoso, Sanders associa as duas tramas que compõem o eixo de seu filme de maneira quase cartesiana, reservando a cada um certo tempo e aos poucos dando conta de preparar o encontro dos dois, momento em que tornam-se óbvias as semelhanças. John Thornton nunca conseguiu se livrar da melancolia que o assola desde que perdeu o filho. A incapacidade de vencer o luto acabou com seu casamento, e tudo quanto restou-lhe foram as garrafas, único consolo que ele admite e ao qual entrega suas poucas economias e suas parcas forças. O colorido pano de fundo para o confronto interno de John é a corrida do ouro no final do século 19, na fronteira com o Yukon canadense, no extremo norte da Califórnia, quadra da história dos Estados Unidos em que uma legião de aventureiros de todos os cantos do país chegavam em busca do sonho da prosperidade e da consequente inclusão nas altas rodas. John, todavia, não se importa com nada disso.

Embora nunca tenha dito, a sorte de Buck é parecida. Ele chegou ao oeste raptado por um traficante de animais, indo parar nas mãos de Perrault e Françoise, um casal que ganha a vida entregando correspondências e mantimentos num trenó puxado por cães. Omar Sy e Cara Gee oferecem o alívio cômico necessário, mormente na longa introdução, deixando subentendida a verdadeira essência dos personagens. A despeito de serem meio vigaristas, Buck, um vistoso mestiço de são-bernardo e pastor escocês, recebe tratamento digno e, ao contrário do que sugeririam algumas conversas de seus estranhos tutores, foi dotado de uma avassaladora vocação para a felicidade. Integralmente criado por computação gráfica, Buck é persuasivo como um verdadeiro melhor amigo do homem porque fica mais e mais encantador, e o John Thornton de Harrison Ford passa batido. Uma das grandes desvantagens de se dividir a cena com colegas de outra espécie, inclusive os virtuais.

Filme: O Chamado da Floresta
Diretor: Chris Sanders
Ano: 2020
Gênero: Aventura/Drama
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.