A vitalidade de um título como “Jovens Bruxas” permanece evidente quando se percebe como o filme articula inquietações típicas da adolescência com tensões sociais que ultrapassam o espaço escolar. O enredo parte de uma premissa reconhecível, mas é no modo como converte inseguranças individuais em experimentos de poder que se encontra seu verdadeiro motor. Sarah (Robin Tunney), recém-chegada a um colégio católico de Los Angeles, passa a circular entre jovens que veem na feitiçaria uma forma de reorganizar uma realidade que as humilha, limita ou simplesmente ignora. O que poderia ser apenas um adorno temático se transforma em um mecanismo para expor a fragilidade das relações construídas sobre ressentimento e desejo de controle.
A chegada de Sarah a esse grupo altera mais do que a dinâmica entre as demais garotas; aciona uma disputa silenciosa sobre quem conduz as decisões que passam a moldar o cotidiano das quatro. A magia, utilizada inicialmente como espécie de amplificador emocional, ganha contornos mais rígidos à medida que cada uma tenta ajustar o mundo à própria medida. O filme investe nessa escalada sem pressa, deixando claro que o problema não está no artifício sobrenatural, mas no impulso de manipular tudo o que frustra, assusta ou ameaça. Quando Nancy (Fairuza Balk) percebe que tem em mãos uma fonte aparentemente inesgotável de poder, a fronteira entre afirmação pessoal e imposição violenta se rompe, revelando a precariedade de convicções que nunca foram de fato discutidas.
A força da história vem da análise quase sociológica das relações de amizade que se formam pela necessidade de pertencimento. As jovens se reconhecem mais pela dor do que por afinidades, e isso é suficiente para sustentar um pacto frágil que ruirá no momento em que cada uma se sentir autorizada a reescrever a própria biografia à base de feitiços. A humilhação sofrida por uma delas, o trauma físico de outra, a condição miserável da líder do grupo e a insegurança silenciosa de Sarah são tratados como gatilhos que justificam experimentos arriscados, e o filme sabe explorar o potencial destrutivo desse conjunto sem recorrer a explicações simplistas.
A virada para o tom mais sombrio, quando as tentativas de corrigir injustiças passam a exigir um preço crescente, reforça a ideia de que poder sem reflexão desorganiza qualquer vínculo que pretenda se sustentar. O roteiro trabalha bem essa progressão, exibindo consequências que não surgem por acaso, mas como efeito direto de escolhas que deixam de considerar limites éticos. As tensões entre as garotas revelam um ambiente em que rivalidades latentes crescem até se tornarem irreversíveis, e o conflito final sintetiza o colapso de um pacto sustentado apenas pela promessa de transformação instantânea.
Mesmo ancorado em referências culturais dos anos 1990, o filme preserva vigor por tratar a adolescência como terreno propício a experimentos que raramente medem impactos. A busca por autonomia, quando guiada por impulsos imediatos, cria caminhos que parecem libertadores até o momento em que o próprio indivíduo se percebe dependente das soluções rápidas que inventou para sobreviver. “Jovens Bruxas” expõe essa contradição sem recorrer a alegorias excessivas e mantém o foco em como a vontade de reorganizar o mundo segundo fantasias pessoais pode esvaziar qualquer senso de responsabilidade.
O desfecho não funciona como lição moral, mas como alerta sobre a instabilidade de alianças estruturadas apenas na sensação de poder renovado. A protagonista, única capaz de identificar os riscos da escalada que testemunha, compreende que qualquer dom extraordinário perde sentido quando se torna instrumento para ampliar ressentimentos. Ao rejeitar a tentação de controlar tudo a partir de forças que mal compreende, ela reafirma a importância de limites que não dependem de rituais, mas de discernimento. É essa conclusão que mantém o filme vivo no imaginário: não a magia em si, mas a forma como traduz a adolescência com seus impulsos, fragilidades e escolhas que podem reverberar muito além do momento em que foram tomadas.
★★★★★★★★★★

