Geração após geração, o ser humano tenta domesticar seus medos, e a tecnologia pode ser uma aliada na eterna busca pela felicidade — ou para garantir-lhe algum prazer efêmero. Enquanto o tempo corre sem alarde, cada um tenta exorcizar seus fantasmas, mas a ameaça do fim nunca se esvai, contendo a verdade com a qual ninguém se acostuma. O amor pela vida é desculpa para atrocidades as mais diabólicas, parte do argumento elaborado por Drew Hancock em “Acompanhante Perfeita”. Sofisticado, o filme de Hancock toca em algumas feridas que a humanidade vai cultivando, não exatamente iludida, mas teimosa, achando que do mal nascerá o bem. Os desafios da convivência, a misoginia, o celibato involuntário são tratados pelo diretor-roteirista com uma dose generosa de nonsense e gore, mas nunca de modo gratuito, levando o espectador a pensar.
Iris e Josh se conhecem na seção de hortaliças e frutas de um supermercado, se olham, flertam e algum tempo depois estão trocando juras de amor. Aos poucos, vai fica claro que há qualquer coisa de artificiosa na incansável subserviência da moça, e Hancock coloca na boca do casal as falas que identificam Iris como uma ginoide, uma robô que emula a aparência feminina, programada para fazer todas as vontades de seu dono-parceiro. Exuberante sem deixar de lado o ar doce, a humanoide vai com Josh à casa de campo de um amigo para passarem o fim de semana, onde são recebidos por Kat, a namorada do anfitrião, Sergey, um comerciante russo que, conforme se vai saber, ficou milionário não por eventuais ligações com a Bratva, mas vendendo grama. Excetuando-se a hostilidade de Kat, tudo corre como ouro sobre azul, e o casal Eli e Patrick garante a diversão com sua irreverência.
Durante uma festa na primeira noite, Iris dá um sinal de que não é tão evoluída, e demonstra estar enciumada com a aproximação de Josh e Kat, e na manhã seguinte, sai para um passeio pelas cercanias de um lago próximo. Ela chega, instala-se numa espreguiçadeira e quase na mesma hora aparece Sergey, que puxa assunto. Ela se sente constrangida, faz menção a um suposto mal-estar do namorado e diz que precisa voltar para cuidar dele. Sergey insiste para que ela fique, Iris cede, e o enredo atinge seu ponto alto. A investida de Sergey depois que Iris aceita passar-lhe bronzeador nas costas e ombros desencadeia um ataque de fúria brutal na robô, e Sophie Thatcher e Rupert Friend protagonizam a melhor cena numa história dessa natureza. Na iminência do desfecho, Thatcher junta-se a Jack Quaid, em trincheiras opostas, para a vingança de que só mesmo uma mulher de carne, osso e mágoas pode ser capaz.
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