Thriller político espanhol é uma das melhores estreias da Netflix dos últimos tempos Divulgação / TriPictures

Thriller político espanhol é uma das melhores estreias da Netflix dos últimos tempos

Fundado em 1959 por dissidentes do Partido Nacionalista Vasco (PNV) como resposta ao regime franquista, o grupo ETA (Euskadi Ta Askatasuna) iniciou como movimento nacionalista, mas ao longo do tempo foi incorporando uma vertente marxista-revolucionária. Se seu começo nasceu do desejo de se libertar da opressão da ditadura de Francisco Franco, ao longo dos anos de sua existência, os ideais do grupo foram se transformando de acordo com as mudanças ocorridas no cenário político e cultural da Espanha.

A repressão do regime franquista e a difícil transição para a democracia criaram um ambiente difícil para reivindicações pacíficas. O grupo passou a enxergar na violência a chave para chamar atenção para suas demandas. Táticas de sabotagem, atentados, extorsões e até assassinatos passaram a ser utilizadas para pressionar o Estado espanhol. Além disso, o grupo se dividiu na década de 1960 entre suas correntes ideológicas.

Embora os anos 1970 e 1980 tenham sido os mais violentos do grupo, com diversos atentados e bombardeios em Madri e Barcelona, eles ainda aconteciam ao longo dos anos 1990 e 2000, mas agora sem apelo popular, devido aos profundos traumas sociais no país. Em “Um Fantasma na Batalha”, filme de Agustín Díaz Yanes, lançado pela Netflix em 2025, acompanhamos uma das principais operações responsáveis por desmantelar o grupo em sua última década de ação.

O filme é centrado na operação “Santuário” e gira em torno de Amaia (Susana Abaitua), uma jovem agente da Guarda Civil, que passa mais de uma década infiltrada no núcleo duro da ETA, com a missão de localizar zulos e desarticular operações. Amaia é uma personagem fictícia inspirada em experiências de agentes reais que atuaram em operações antiterroristas de grande impacto. Todo o roteiro de Díaz Yanes foi baseado em documentação e entrevistas com pessoas que vivenciaram o contexto.

Com um orçamento de aproximadamente 10 milhões de euros, o filme só alcançou essa verba graças à parceria com a Netflix. Com montagem de Bernat Vilaplana, os cortes alternam cenas íntimas de tensão e imagens reais de atentados e acontecimentos públicos, provocando no espectador um desgaste psicológico sem recorrer ao melodrama. A tática é mostrar o trauma coletivo por meio de uma mistura do thriller psicológico com a historicidade. O uso de luz natural, paleta dessaturada e um estilo de realismo dramático quase documental favorece a sensação de infiltração, disfarce e espionagem, sustentando o tom melvilleano da fotografia de Paco Femenía.

O filme adota uma abordagem que evita o foco em dramas pessoais ou na trajetória individual de Amaia, priorizando uma reconstrução documental dos eventos históricos e das dinâmicas políticas de seu país. A opção de Agustín Díaz Yanes foi representar o conflito sem recorrer a recursos melodramáticos ou a cenas de impacto emocional que pudessem comprometer a memória das vítimas. A estrutura narrativa aposta na contenção e na verossimilhança, conduzindo o espectador por uma tensão constante que nasce da precisão factual e da atmosfera realista. No entanto, essa escolha estética pode frustrar parte do público acostumado a narrativas de ação mais espetaculares, aproximando o longa mais do cinema político e histórico do que do entretenimento convencional.

Filme: Um Fantasma na Batalha
Diretor: Agustín Díaz Yanes
Ano: 2025
Gênero: Drama/História/Suspense
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★
Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.