Por que este filme na Netflix virou o queridinho das comédias românticas com adrenalina? Divulgação / Columbia Pictures

Por que este filme na Netflix virou o queridinho das comédias românticas com adrenalina?

Um caçador de fianças recebe a missão de encontrar uma repórter que faltou ao tribunal, sem imaginar que a fugitiva é a ex-esposa e que o trabalho combina orgulho ferido e contas por acertar. “Caçador de Recompensas” reúne Jennifer Aniston e Gerard Butler sob direção de Andy Tennant, que aposta no reencontro forçado para reativar sentimentos em meio a perseguições, mal-entendidos e uma pista criminal que cresce à medida que a dupla se desloca por estradas e cassinos.

A história apoia-se no contraste entre perfis que já fracassaram como casal, mas continuam a se provocar com uma familiaridade que vira combustível cômico. Jennifer Aniston investe no timing para a ironia e compõe uma jornalista obstinada, menos interessada em romance do que em fechar a pauta que lhe escapou. Gerard Butler adota postura fanfarrona, com comentários atravessados e um senso de esperteza que nem sempre o salva das próprias escolhas. Quando o roteiro lhes reserva trocas rápidas, a dinâmica floresce; quando exige que o flerte surja em meio a tiros ou corridas, a sintonia perde gás e a interação soa deslocada no quadro da ação.

A mistura de gêneros define o norte, mas o filme patina ao dosar a tensão. Tennant conduz perseguições e escapadas com correção, sem apostar em risco real. Os antagonistas aparecem de forma funcional, resolvendo tarefas de enredo e desaparecendo antes de impor pressão. A investigação impulsiona os deslocamentos e justifica os choques do par, mas raramente impõe risco que mude o jogo. Falta a sensação de perigo que converteria os percalços do caminho em ameaças palpáveis, o que reduz a impressão de etapas cumpridas por obrigação.

Esse descompasso se reflete no ritmo. O começo, mais leve, se vale de situações físicas que retomam a tradição de casais brigando enquanto dividem espaço e objetivos contrários. A partir da metade, as idas e vindas se repetem, e coincidências empurram a dupla para o próximo ponto da rota. A montagem prefere atalhos que apressam conflitos, e algumas resoluções chegam com rapidez que dilui o impacto cômico ou dramático. O percurso mantém a roda girando sem ampliar o envolvimento.

O elenco de apoio contribui com interferências pontuais. Colegas de redação, policiais e pequenos golpistas entram para complicar ou simplificar a jornada, quase sempre com traços caricaturais. Um admirador insistente de Nicole rende um motivo recorrente de humor, mas aparece sublinhado além do necessário. São presenças que preenchem o mundo do filme, sem, contudo, ameaçar tomar a frente da história ou desafiar a dinâmica central entre Aniston e Butler.

No campo técnico, a fotografia privilegia tons solares, estradas abertas e ambientes de jogo, enquanto a trilha alterna sucessos radiofônicos e marcações cômicas. A câmera opta por planos médios e cobertura segura, priorizando clareza sobre ousadia. As sequências de perseguição mantêm-se dentro de um limite que preserva a classificação indicativa e evita impactos mais duros. O desenho de produção privilegia espaços de trânsito, estacionamentos, quartos de hotel, salões de apostas, que funcionam como passagens, não como lugares com personalidade própria.

Mesmo com esses limites, a proposta deixa ver lampejos de algo mais divertido. Sempre que a narrativa abraça o espírito screwball e transforma o par algemado em motor de confusões, a comédia ganha ritmo. Há graça na batalha de egos, nas pequenas vinganças e no modo como antigas mágoas reaparecem em piadas com lastro emocional. Quando o filme admite que o adversário principal é o orgulho dos protagonistas, e não o vilão que circula pela investigação, surge uma nota de sensibilidade doméstica que dialoga com o riso sem descartá-lo. Essa intuição, entretanto, nem sempre encontra desenvolvimento.

O retrato do ex-casal evita sentimentalismo fácil. O humor nasce do atrito acumulado por anos de convivência interrompida e pela incapacidade de recuar durante a missão. Ela defende o trabalho com teimosia profissional; ele, a própria esperteza como escudo para inseguranças. Ao cruzar esses temperamentos com acontecimentos que exigem cooperação, o filme encontra espaço ideal para reaproximações improvisadas, promessas quebradas e brechas de confiança. Quando as situações exigem parceria sincera, aparecem decisões que sugerem um futuro possível, sem decretar reconciliação plena.

A mão de Andy Tennant busca uma cadência acessível, que prioriza trocas verbais e gags físicas sobre violência. Essa escolha valoriza a presença dos atores e sustenta momentos de leveza, embora reduza o senso de perigo e, por consequência, o impacto dos reveses. O diretor conhece o desenho básico da comédia romântica e sabe como manter o interesse aceso, mas evita qualquer risco que possa turvar o passeio da dupla. Esse cálculo produz um filme amável que prefere a segurança da repetição a saltos mais ousados.

“Caçador de Recompensas” acaba se firmando como opção de entretenimento no registro de sessão informal. A química entre Jennifer Aniston e Gerard Butler oscila, mas comparece quando o texto lhes dá margens para o atrito espirituoso. O humor funciona melhor em embates verbais do que nas passagens de ação, e a trama policial cumpre serviço de correia transportadora. Fica a curiosidade sobre o que aconteceria se Tennant decidisse apertar o parafuso do perigo ou enxugar as repetições para deixar o casal em primeiro plano absoluto, hipótese que poderia elevar o jogo entre orgulho e desejo que sustenta a jornada.

Filme: Caçador de Recompensas
Diretor: Andy Tennant
Ano: 2010
Gênero: Ação/Comédia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★