Humor ácido e suspense: a melhor comédia de 2025 (até agora) acaba de chegar à Netflix Divulgação / Netflix

Humor ácido e suspense: a melhor comédia de 2025 (até agora) acaba de chegar à Netflix

Um voo comercial é sequestrado e a rota prevista se converte em tabuleiro geopolítico. Em seguida, “Good News” insere agências de inteligência, militares e políticos em disputa por controle narrativo, enquanto passageiros e tripulação se tornam moeda tática. Dirigido por Byun Sung-hyun, com Sul Kyung-gu, Hong Kyung e Ryoo Seung-bum nos papéis centrais, o longa toma como ponto de partida um episódio histórico de 1970 para acompanhar a coreografia terrestre de negociações, telefonemas e ordens sussurradas. O título brasileiro surge ainda no primeiro movimento do enredo, quando autoridades esboçam uma solução improvável para evitar uma tragédia diplomática.

A trama acompanha a chegada do avião ao espaço aéreo aliado, sob ameaça constante de decisões erradas. O governo convoca um operador fantasma, conhecido pela frieza e pela habilidade em conduzir crises sem deixar rastros; ele atua à margem do protocolo, estuda brechas e prevê reações. Na outra ponta, um jovem oficial assume o trabalho de campo com senso de responsabilidade que esbarra na opacidade das ordens superiores. Entre ambos, um dirigente de inteligência move peças conforme conveniências políticas, atento à imprensa e ao jogo de poder doméstico.

“Good News” alterna tensão e ironia ao mostrar salas de reunião, hangares e escritórios como arenas. O riso nasce do absurdo administrativo, não de piadas declaradas. A encenação prefere planos que valorizam corredores, portas que abrem e fecham, olhares que evitam a câmera, como se cada gesto pudesse ampliar ou reduzir o perigo. O desenho sonoro usa rádios, passos e papéis manuseados para indicar prioridades em conflito; quando o silêncio toma a cena, fica evidente que custos pessoais se acumulam fora da vista de quem assina as ordens.

Sul Kyung-gu compõe um operador cuja reputação circula antes dele. A voz baixa e a economia de movimentos sugerem devoção à eficácia, mesmo quando isso exige driblar regras. Hong Kyung interpreta um militar no limiar entre lealdade e consciência; seu olhar denuncia a colisão entre missão e ética. Ryoo Seung-bum traz humor azedo à figura institucional que sabe negociar com superiores, imprensa e rivais internos. São interpretações que se complementam sem gritar por atenção, preservando o foco nos dilemas e nas escolhas concretas feitas sob relógios que não param.

Byun Sung-hyun conduz o material com clareza visual e aposta em cortes que mantêm a informação fluindo sem confundir. A fotografia prefere cores contidas e contrastes secos, realçando superfícies de metal, vidro e concreto, quase como uma paisagem administrativa. A câmera evita virtuosismo gratuito e cede espaço para o diálogo, transformando palavras em armas de curto alcance. A trilha musical, discreta, funciona como batimento dramático; entra para marcar impasses e recua quando as salas se enchem de indecisão. O conjunto favorece a sensação de que cada minuto gasto em hesitação pode custar vidas fora do quadro.

O filme ganha fôlego nas passagens em que as autoridades preparam um teatro logístico para conduzir a negociação. Sem revelar desfechos, o relato mostra como a solução pensada em terra depende de truques visuais, versões controladas e promessas feitas para consumo imediato. A sátira aparece quando a autopreservação de carreiras conta tanto quanto a segurança dos anônimos do avião. Essa ambiguidade mantém a obra em registro político, sem perder o vínculo com os acontecimentos práticos que movem a intriga.

Nem tudo se resolve com a mesma nitidez. O segundo ato amplia a quantidade de personagens e setores envolvidos, e a multiplicação de linhas paralelas por vezes dilui o eixo emocional. Algumas piadas se alongam além do necessário e retiram parte do ar de urgência que se impôs no começo. Ainda assim, sempre que o roteiro retorna ao jovem oficial em campo, a narrativa recupera intensidade e clareza de propósito, pois nele se concentram as dúvidas que qualquer organização prefere empurrar para baixo do tapete.

Há interesse especial na forma como “Good News” trata a responsabilidade pública. O filme questiona, sem discurso, a distância entre o que os comunicados oficiais prometem e o que as equipes conseguem cumprir sob pressão. Quando decisões são justificadas por ganhos de imagem, a prioridade real se revela: evitar que a falha apareça. Essa perspectiva coloca a comédia em choque com o suspense, e o atrito entre os dois registros cria uma leitura amarga da rotina estatal. Nos rostos exaustos dos técnicos e soldados, a narrativa encontra a dimensão humana das escolhas.

A construção espacial também reforça esse tema. Salas frias comprimem quem precisa decidir, enquanto pistas e pátios expõem a insignificância do indivíduo diante de aviões, viaturas e esquadrões. Em ambientes fechados, o movimento da câmera mantém a proximidade com papéis, mapas e telefones, insistindo na materialidade do trabalho que sustenta a encenação pública do poder. Não há heroísmo grandiloquente: há cálculo, receio de culpa e tentativas de evitar que a opinião pública perceba o tamanho do risco.

Quando se aproxima do desfecho, “Good News” preserva a tensão ao lembrar que nenhum plano resiste totalmente ao imprevisto. As relações entre os três personagens centrais chegam a um ponto em que divergências éticas ganham corpo, mas o filme recusa respostas confortáveis. O operador quer resolver, o oficial busca entender o que é certo, o dirigente tenta garantir a própria sobrevivência política. Essas forças compõem um panorama em que a solução possível custa caro e deixa marcas que não saem com um comunicado de imprensa.

O resultado permanece na memória menos pelas decisões técnicas do caso e mais pela clareza com que expõe a lógica de imagem que molda governos em momentos de crise. Quando a “boa notícia” finalmente parece ao alcance, resta a pergunta sobre como cada participante lidará com o que foi feito para chegar até ali. É uma dúvida que não se encerra com os créditos e que ajuda a explicar por que episódios reais semelhantes seguem produzindo histórias décadas depois.

Filme: Good News
Diretor: Byun Sung-hyun
Ano: 2025
Gênero: Ação/Comédia/Crime/Mistério/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★