Alice decide pausar um relacionamento de anos para experimentar a vida sozinha em Nova York, onde reencontra a irmã mais velha e tenta descobrir que tipo de rotina deseja construir. “Como Ser Solteira” acompanha esse período de reinvenção cercado por amigas, encontros passageiros e dúvidas que amadurecem com a cidade acesa. Lançado em 2016, o filme traz Dakota Johnson, Rebel Wilson, Leslie Mann e Alison Brie à frente do elenco, sob direção de Christian Ditter, e é inspirado no livro “How to Be Single”, de Liz Tuccillo, referência que orienta a multiplicidade de pontos de vista.
A narrativa apresenta quatro trajetórias que se cruzam em bares, escritórios, corredores de hospital e apartamentos apertados. Alice, recém-saída do namoro, aprende códigos práticos e emocionais da vida independente. Robin, colega de trabalho, incentiva a imersão no circuito noturno e enxerga no improviso o motor da diversão. Meg, obstetra que passa o dia recebendo bebês, decide ser mãe solo por inseminação, gesto que redimensiona sua relação com o corpo e o trabalho. Lucy, obcecada por cálculos amorosos, trata aplicativos de encontro como lista, convencida de que regras fixas aproximam resultados desejados. Os homens que orbitam o grupo, um barman adepto de relações sem rótulos, um viúvo em reconstrução, um pretendente gentil, servem como pontos de contato para que cada uma teste convicções, medo e desejo diante de escolhas que raramente são lineares.
Christian Ditter filma Nova York como uma cidade de passagem, com noites cortadas por luzes artificiais e manhãs que cobram a conta das decisões. Em vez de proclamar verdades sobre solteirice, o roteiro opta por situações que soam reconhecíveis: negociar contas, aprender a morar sozinha, fazer amizade com o silêncio de um sábado, aceitar que a agenda afetiva não se resolve por decreto. O humor vem tanto de esquetes cômicas quanto de observações do dia a dia, e encontra em Rebel Wilson um catalisador para piadas que assumem o excesso como parte do jogo. Há espaço, também, para a delicadeza de Dakota Johnson, que enxerga em Alice alguém dividida entre a lembrança do conforto de um relacionamento e a curiosidade por um cotidiano guiado pelas próprias regras.
As tramas paralelas nem sempre mantêm o mesmo fôlego. Lucy, por exemplo, rende boas notas quando o filme cutuca a mania contemporânea de transformar encontros em lista, mas perde intensidade quando corre para soluções que soam cômodas. Meg começa como retrato afirmativo de maternidade independente e depois acomoda conflitos ao redor de um interesse amoroso que suaviza tensões em excesso. Ainda assim, a presença de Leslie Mann sustenta humor físico e constrói uma personagem que tenta conciliar plantões extensos com o cansaço emocional de decisões irreversíveis, o que dá espessura a seus dilemas.
A dinâmica entre Alice e Robin funciona como motor de vitalidade. Wilson encarna o tipo que domina a festa e dita regras informais para sobreviver a noites intermináveis, enquanto Johnson contrapõe um olhar curioso, por vezes melancólico, que pede espaço para perceber se esse ritmo cabe no dia seguinte. Quando juntas, produzem cenas de amizade que não dependem de confissões grandiloquentes, mas de gestos práticos: dividir um táxi, evitar mensagens que compliquem a manhã, saber a hora de ir embora. Esses detalhes ajudam a ancorar a história em experiências reconhecíveis e afastam a caricatura.
A direção investe em cortes ágeis que alternam festa e rotina, apostando na ideia de que cada escolha noturna repercute no trabalho, no bolso e na disposição para o próximo encontro. A fotografia acentua contrastes entre neon e luz fria de escritório sem transformar a cidade em cartão-postal, e a trilha pop marca o pulso das sequências urbanas. Quando o volume baixa, há momentos breves de introspecção que não soam artificiais, como se o filme reconhecesse a importância de escutar um pensamento antes da próxima notificação.
O roteiro evita levantar bandeiras sobre qual modelo de vida seria superior. Em vez disso, propõe acompanhar o processo de calibragem: o que significa abrir mão de um namoro confortável para testar fronteiras pessoais; como amigos interferem na noção de liberdade; de que modo trabalho e dinheiro modulam a disponibilidade para o prazer e para o cuidado. Ao tratar a solteirice menos como marca identitária e mais como período de aprendizado, o filme preserva um certo frescor de observação, mesmo quando recorre a atalhos conhecidos do gênero.
Há tropeços. Algumas piadas envelheceram depressa e certos arcos masculinos permanecem planos, cumprindo função variável ao longo da trama sem ganhar contorno próprio. Em contrapartida, pequenas escolhas ajudam o conjunto a respirar: permitir que Alice trabalhe o próprio espaço, reconhecer o valor das amigas como rede concreta, admitir que aplicativos podem ser úteis sem virarem oráculo. As histórias individuais raramente se resolvem por conclusões taxativas, o que combina com a percepção de que a vida afetiva recusa protocolos estáveis.
“Como Ser Solteira” não busca um triunfo romântico como meta inevitável. Observa caminhos possíveis quando a pressa cede e o cotidiano mostra alternativas para além do par perfeito. Fica a imagem de mulheres que aprendem a escolher, errar, corrigir rota e continuar circulando por uma cidade que alterna euforia e recuo, movimento que tende a reaparecer em outras fases da vida adulta.
★★★★★★★★★★