“Boys on the Side” começa como uma comédia de estrada, se desenrola como um drama íntimo e termina como um delicado tratado sobre amizade, perdão e sobrevivência. O que poderia ser apenas um relato sobre três mulheres cruzando os Estados Unidos se torna um retrato surpreendentemente honesto sobre a vulnerabilidade e a força feminina diante de um mundo que insiste em testá-las.
Robin, Jane e Holly são três universos colidindo. A primeira, metódica e silenciosa, viaja com a doença que tenta disfarçar; a segunda, uma cantora lésbica de humor ácido, usa a ironia como escudo; e a terceira, uma jovem grávida e impulsiva, carrega o caos de quem ainda não aprendeu a se proteger. Unidas por circunstâncias fortuitas, essas mulheres formam uma constelação de diferenças que, aos poucos, revela o mesmo centro gravitacional: o desejo desesperado de encontrar um lugar de acolhimento, mesmo que esse lugar seja o outro.
O filme opera em um registro curioso, alternando a leveza quase ingênua de certas situações com a brutalidade de perdas irreversíveis. Essa oscilação entre o riso e o desespero não é um defeito, mas uma verdade emocional: a vida raramente se organiza em tons coerentes. Há dias em que a tragédia e a ternura dividem a mesma mesa, e o longa de Herbert Ross entende isso melhor do que muitos dramas que se pretendem profundos. O humor surge como forma de resistência, não de fuga: uma maneira de continuar respirando quando o ar rareia.
A direção evita idealizar suas protagonistas. Todas são falhas, contraditórias e, por isso mesmo, profundamente humanas. O roteiro não busca torná-las exemplares, mas reconhecíveis: mulheres que se machucam, se protegem e se redimem, mesmo quando o perdão vem tarde demais. A amizade entre elas se constrói na imperfeição, nas mentiras contadas por medo, nas confissões sussurradas no limite da confiança. Há uma beleza desconcertante nesse laço que não promete eternidade, mas oferece presença. E às vezes, isso é o que salva.
A presença masculina, em contraste, não é demonizada, mas deslocada. Os homens aparecem como figuras periféricas, satélites ocasionais orbitando a jornada principal. Essa inversão de eixo é proposital e necessária: o centro aqui pertence às mulheres e à maneira como elas aprendem a se reconhecer fora dos papéis esperados delas, mãe, amante, cuidadora. “Boys on the Side” não é um manifesto de exclusão, mas de afirmação: um lembrete de que o olhar feminino pode ser protagonista sem pedir licença.
O que permanece não é a dor da perda, mas a estranha serenidade que surge quando se aceita que a vida é feita de despedidas e reencontros invisíveis. O filme se despede sem dramatizações, como quem entende que a amizade não precisa de eternidade para ser verdadeira. É um daqueles raros retratos que, ao falar sobre mulheres, fala sobre o humano em sua totalidade, com falhas, contradições e uma coragem silenciosa que persiste mesmo quando tudo parece se desmanchar.
★★★★★★★★★★