Mais de 400 indicações a prêmios e 2 estatuetas do Oscar: o melhor filme de Tarantino está na Netflix Andrew Cooper / Sony Pictures

Mais de 400 indicações a prêmios e 2 estatuetas do Oscar: o melhor filme de Tarantino está na Netflix

“Era uma Vez em… Hollywood” é o tipo de filme que parece rodar em câmera lenta dentro da cabeça do espectador, como uma lembrança que se nega a ir embora. Tarantino não faz aqui uma ode ao passado, mas um sonho lúcido sobre o que poderia ter sido. A Hollywood de 1969, reinventada por sua lente, é menos um cenário e mais um estado emocional: um lugar onde a luz dourada do entardecer encobre o medo de que a festa acabou e ninguém percebeu. Tudo respira nostalgia e decadência, mas com o charme insolente de quem ainda acredita que o show pode continuar.

No centro desse crepúsculo está Rick Dalton, um ator que já brilhou o suficiente para ser reconhecido, mas não o bastante para ser lembrado. Leonardo DiCaprio o interpreta com uma vulnerabilidade encantadoramente patética: um homem preso entre o espelho e o fracasso, tentando ensaiar a própria redenção diante de uma plateia que talvez nem exista mais. Há algo de trágico e cômico na forma como ele tenta provar que ainda é “alguém”, e Tarantino transforma essa mediocridade em matéria-prima de uma grande fábula sobre a ilusão do sucesso. Cada cena em que Rick tenta reencontrar o brilho perdido é, na verdade, uma luta para continuar sendo o herói da própria história.

E se Rick vive atormentado por quem foi, Cliff Booth existe em paz com quem é. Brad Pitt compõe esse dublê com um carisma tão relaxado que beira a imoralidade. Ele representa o oposto do amigo: enquanto Rick busca relevância, Cliff flutua entre as ruínas do estrelato com uma leveza quase filosófica. Sua presença é uma espécie de antídoto contra o desespero de Hollywood: um lembrete de que talvez o que resta, quando o glamour acaba, seja apenas a capacidade de rir, dirigir por Los Angeles e não levar nada a sério. O cachorro, o ácido e a pancadaria final só reforçam a ironia: Cliff é o personagem que vive num mundo que Rick só representa.

Mas é Sharon Tate quem transforma o filme em algo maior do que uma história sobre decadência. Tarantino lhe devolve o que a realidade lhe tirou: a possibilidade de existir sem ser vítima. Margot Robbie a interpreta como um raio de luz que passa pela tela sem pedir licença. Uma mulher que dança, ri e se emociona assistindo a si mesma no cinema, sem saber que o público a observa com ternura e temor. Ao invés de revisitar o horror, Tarantino reescreve o destino. E, nesse gesto, cria uma das cenas mais singelas de sua filmografia: a alegria pura de Tate diante de sua própria imagem, uma celebração da presença antes da tragédia.

No desfecho, quando a ficção atropela a história e os assassinos se tornam os alvos, o filme finalmente assume o que sempre foi: um conto de fadas. A brutalidade deixa de ser catarse e vira libertação — não só de personagens, mas de uma geração inteira que viu o sonho de Hollywood se tornar pesadelo. “Era uma vez” é a senha para a utopia: a de que o cinema ainda pode consertar o que a vida quebrou. Tarantino não reconta os fatos; ele reescreve a memória, trocando sangue por esperança e transformando a tragédia real em fantasia curativa.

“Era uma Vez em… Hollywood” é menos sobre o passado e mais sobre o desejo humano de que o passado pudesse ter sido diferente. Um filme que respira com o ritmo de quem entende que envelhecer não é morrer, é lembrar com mais cuidado. Tarantino fez sua carta de amor mais sincera, não à Hollywood dos holofotes, mas àquela que vive no imaginário de quem ainda acredita que o cinema pode, por duas horas e meia, reinventar o mundo.

Filme: Era Uma Vez… Em Hollywood
Diretor: Quentin Tarantino
Ano: 2019
Gênero: Comédia/Drama
Avaliação: 10/10 1 1
★★★★★★★★★★
Fernando Machado

Fernando Machado é jornalista e cinéfilo, com atuação voltada para conteúdo otimizado, Google Discover, SEO técnico e performance editorial. Na Cantuária Sites, integra a frente de projetos que cruzam linguagem de alta qualidade com alcance orgânico real.