Um recomeço imposto por necessidades domésticas puxa um ex-astro de volta ao circuito de golfe, reabre rivalidades enterradas e expõe escolhas que ele adiou por anos. As partidas ganham relevo público, a conta do passado chega e o protagonista passa a negociar com um corpo menos elástico e com uma vitrine de expectativas que o encurrala. Em “Um Maluco no Golfe 2”, Adam Sandler retorna ao personagem, cercado por Julie Bowen, Christopher McDonald e Ben Stiller, com direção de Kyle Newacheck. O cenário esportivo volta a servir de palco para colisões cômicas, disputas de vaidade e pequenos gestos de afeto que mantêm o riso próximo do cotidiano.
A trama se organiza de maneira direta. Um problema objetivo cria urgência, reinsere o herói na competição e reacende a relação conflituosa com códigos de etiqueta que nunca foram seu forte. Newacheck filma o jogo com proximidade, apostando em cortes que preservam o tempo da piada e em enquadramentos que favorecem o improviso corporal de Sandler. O humor nasce menos do golpe perfeito e mais do descompasso entre um temperamento intempestivo e a coreografia social do esporte. As cenas evitam pompa; a imagem prefere o gesto, o olhar atravessado, a pausa que antecede o riso. Quando a emoção pede passagem, o filme recua um pouco, sem diluir a energia que sustenta o personagem.
A nostalgia aparece, mas não conduz. Reencontros servem à narrativa, não apenas ao reconhecimento fácil. Velhos nomes retornam para testar como o protagonista lida com o que ficou para trás e com aquilo que se transformou. A graça está em observar o ajuste fino entre impetuosidade e prudência, como se cada explosão agora exigisse uma decisão consciente. Em vez de vitrificar lembranças, a produção coloca o passado em movimento e faz dele um componente do presente, o que devolve ao riso um sabor atual.
Sandler domina a mecânica do personagem. O corpo corre torto, a frase sai meio atravessada e, de repente, um insulto vira confissão involuntária de fragilidade. O ator utiliza a repetição como trampolim e intercala grosseria infantil com doçura de relance. O temperamento explosivo continua lá, porém a idade acrescenta um filtro que torna cada reação mais estratégica. Quando o protagonista estoura, revela algo sobre o medo de perder relevância; quando se contém, surge um tipo de escuta que antes não cabia no vocabulário dele. Dessa tensão nasce um humor que conserva exageros sem depender apenas deles.
O elenco de apoio funciona como contraponto e espelho. Julie Bowen oferece medida e pragmatismo, enquanto Christopher McDonald recupera a altivez que sempre cutucou o herói no lugar certo. Ben Stiller reaparece com ironia que cutuca o entorno midiático do golfe, sem transformar tudo em caricatura. As participações pontuais de rostos conhecidos do esporte adicionam textura e situam o personagem diante de um circo profissional que nunca deixou de olhá-lo com ressalvas. Essa convivência reforça o tema central: a disputa não acontece só no gramado, mas também no convívio com rituais e expectativas externas.
Visualmente, o filme prefere planos médios e close-ups que destacam reações, tropeços e pequenas vitórias. A fotografia não busca embelezar o campo, e o som privilegia o estouro da risada, a vibração do público e o atrito dos bastidores. A montagem alterna explosão e respiro, deixando a piada assentar antes de avançar para o próximo obstáculo. Essa cadência impede o cansaço e reserva espaço para sinais de melancolia que aparecem sem alarde. A trilha não carimba a emoção; trabalha como apoio discreto, abrindo espaço para o tempo do gesto ou do silêncio.
Quando patina, o filme o faz por confiar demais em fórmulas conhecidas. Algumas gags parecem deslocadas de outra década e perdem força diante de um público que já viu variações infinitas do mesmo tropeço. A repetição, às vezes, vira conforto e reduz o risco. Ainda assim, sempre que a sequência ameaça cair na redundância, Newacheck reposiciona o protagonista diante de dilemas concretos: patrocinadores, calendário, saúde, família. O riso volta a ganhar densidade porque encontra consequência dramática clara, sem recorrer a atalhos sentimentais.
O golfe aparece como arena de etiqueta e mercado. O herói precisa performar para patrocinadores, negociar entrevistas, administrar redes sociais e aprender uma liturgia que sempre lhe pareceu ridícula. Essa camada acrescenta atrito observável e renova a comicidade, já que o personagem continua sendo um corpo estranho entre regras rígidas. O filme extrai humor da discordância entre protocolo e impulso, sem demonizar o esporte. Há graça quando a pose desaba diante de uma resposta torta, e há ternura quando a teimosia dá lugar a um pedido de ajuda.
A direção encontra equilíbrio entre barulho e contenção. A câmera não transforma cada tacada em epopeia e preserva a sensação de que o resultado importa menos do que a convivência. O tornozelo torcido, a piadinha fora de hora, o olhar de canto que pede desculpa sem dizer água são observados com paciência. O espectador acompanha um retorno que não pretende coroar um campeão definitivo, e sim medir a distância entre o passado e o presente de um sujeito que nunca coube no molde. Esse ângulo favorece o interesse por cenas de bastidor e desloca o foco do troféu para as relações construídas no processo.
Resta a percepção de que a sequência escolhe um caminho honesto. “Um Maluco no Golfe 2” prefere admitir limitações e apostar no carisma testado de seu elenco do que simular novidade a qualquer preço. O filme encontra espaço para o riso físico, para a careta que chega um segundo atrasada e para um tipo de ternura associada à persistência, não à perfeição. O protagonista mantém a mania de empurrar portas com o ombro, mas passa a escolher em quais vale insistir. Fica a curiosidade sobre como esse humor continuará a envelhecer quando o circuito pedir mais disciplina e quando a audiência cobrar outra medida de risco.
★★★★★★★★★★